MAMARRACHISMO (à atenção de Carlos Carreiras)
Há uma data de anos, ao pé da estação de Cascais, brilha um mamarracho inacabado. Como é de timbre, a municipal burocracia licenciou, deslicenciou, tornou a licenciar, mais andar menos andar, mais papel menos papel, mais técnico menos técnico, mais regulamento menos regulamento, mais vereador menos vereador, enfim, um daqueles processos só imagináveis por loucos, mas que tão comuns são na nossa terra. Finalmente, para ajudar a distinta Câmara, parece que o construtor, ou o promotor, ou alguém, foi à falência. Orgulhoso, o mamarracho foi resistindo. Quatro anos depois – só quatro anos! – a autarquia resolveu demolir a coisa e encarregar o povoléu de dizer o que quer que lá se ponha. É a “democracia” directa, muito útil para desacreditar a outra. Nos jornais, pululam já os mais rasgados elogios à corajosa atitude da autarquia.
O IRRITADO está de acordo. Seja demolido o monstro. Não se sabe se, depois de pronto, seria tão monstro como isso. Dê-se esta asserção de barato. Muito bem, venha o camartelo, que já não é sem tempo.
Nesta matéria, talvez fosse de pedir alguma coerência ao simpático município. Para tal, conviria dar o mesmo destimo, por exemplo, às novas instalações da Polícia, mamarracho bem pior que o tal do largo da estação: uma caixa de fósforos colossal, colocada a 30 centímetros da faixa de rodagem, forrada de azulejos que nem o urinol da mais porca tasca aceitaria, completamente desinserida da paisagem urbana que a rodeia, uma miséria. Ainda por cima, leu-se não sei onde que as autoridades locais vão adquirir um palácio, salvo erro em Carcavelos, para alojamento da PSP. Então, e o mamarracho? O povo gosta? O povo não é chamado a pronunciar-se? A Câmara não faz nada?
Já agora, e o musseque (nome gentilmente dado pelo tal povo ao crime urbano que são os caixotes negros atravancados no nobre sítio onde um dia esteve o Estoril Sol)? Não merecem demolição? Merecem pois. Só que... só que, nada, estão ali para ficar, com grande e municipal orgulho. Nem há moralidade nem comem todos.
3.2.15
António Borges de Carvalho