A QUADRATURA DA ASPIRINA
Com o seu arzinho de boa pessoa, o mui eficaz, competente e já famoso ministro da saude, ou assim chamado, resolveu dizer à Pátria que, em gesto de grande generosidade descentralizadora, ia transferir o Infarmed para o Porto. O interessante autarca lá do sítio apressou-se a elogiar a corajosa medida, muito condizente com o portoótico orgulho. Não acho mal. Quanto mais burocratas sairem de Lisboa melhor.
Fatal engano o meu. Sua excelência, com medo de mais alguma greve, apressou-se a declarar, para sossego das massas e dos partidos de esquerda, que nem um funcionário teria que ir se deslocar.
Como é?, perguntar-se-á. Então a coisa vai para o Porto e o pessoal fica em Lisboa? Que raio é isto?
Tratando-se de iniciativa da geringonça, há várias hipóteses a considerar. Ou é tudo mentira, o que é o mais provável, ou então mete-se mais 350 funcionários lá em cima e ficam os outros 350 cá em baixo a coçar os sovacos, assim se criando “emprego qualificado”. Outra hipótese, a mais “justa”, será a semana de 17,5 horas para os 700, o que muito agradará ao Arménio e poderá até ser usado como exemplo para toda a função pública.
Algo me diz que, daqui a um ano, andará o tipo do Porto aos gritos, que ainda não foi cumprida mais esta doce promessa da geringonça.
A seguir se transcreve a história falada da histórica decisão.
- Ó Adalberto, esta de os tipos dos remédios da UE irem para Amesterdão é uma chatice para aquele gajo do Porto que deu com os pés ao PS. Bem feita! Nada que não se soubesse à partida, cá no rectângulo só Lisboa tinha hipóteses, e poucas. Porreiro pá. Lisboa fica como estava, o Medina poupou um trabalhão e não se arriscou a ficar de fora. Nada que eu não tivesse em mente quando pus os deputados a votar a mudança. Genial, não achas?
- Com certeza que acho. Mas, ó António, o que é que eu tenho com isso?
- Muito, meu caro, muito. Temos que aproveitar para acalmar a dor de corno do fulano, a ver se o agarramos outra vez. Já que não vai a UE, vais tu.
- Eu?
- Não te assustes, era um refismo.
- Como?
- Pois, parece que nestes casos se diz qualquer coisa acabada em ismo.
- Talvez eufemismo...
- Adiante. Tu não vais. Mandas para lá aquela coisa da aspirina que está em Lisboa, os gajos ficam todos contentes, e marcámos mais um golo. É a descentralização, porra!
- Julgo que te referes ao Infarmed.
- O nome não interessa, desde que acabe em med. Estás perceber?
- E como é que eu vou mudar 350 mamíferos de Lisboa para o Porto?
- Vamos lá ver se percebes. Não mandas ninguém, é preciso ter cuidado com o PC. Pessoal fora da zona de conforto é que não.
- Então como é que...
- Não sei. Arranja-te. Diz qualquer coisa que agrade a todos. Diz que não é para já. Daqui a um ano ou dois falamos outra vez.
- Se achas...
- Força meu rapaz, coragem! Tens que aprender a dizer coisas, olha que governar é dizer coisas.
Se não foi assim, podia ter sido. É o costume.
22.11.17