VOTO INÚTIL
Não sei ao certo qual o raciocínio que leva a líder do CDS a afirmar que “acabou o voto útil”. Pode ser que seja muito lógico, mas, como noutros casos, não se vislumbra a utilidade da ideia. Nunca votei “útil”, pelo menos segundo os critérios do CDS, sempre votei útil segundo os meus.
O que pode inutilizar o voto das pessoas é o uso que lhe for dado pelas abertas do sistema.
Foi o que aconteceu em 2015: o meu voto ganhou, mas foi deitado para o caixote do lixo. Pode dizer-se que, por este critério, dona Assunção tem razão: o meu voto passou a inútil, como que aconteceu ao da esmagadora maioria dos portugueses. Só há, ou poderia haver, uma interpretação legítima do resultado dessas eleições: a coligação mais votada foi a que estava no poder. Baixou o seu score, mas não deixou de ser a mais votada. O eleitorado, se interpretados os resultados com seriedade, apontou claramente para a continuidade do governo anterior, mas com menos margem de manobra, isto é, ou via coligação com o PS, ou via abstenção do PS.
Aliás, era essa a leitura política tradicional na III República. Sem uma única excepção. Quando, hoje, as mesnadas do PS dizem, com formal razão, que não há eleições para primeiro-ministro, esquecem que quem inventou o contrário (eleições internas do “candidato a primeiro ministro”) foram elas, o que nos dá um sinal claro da diferença entre a seriedade e a oportunidade. O seu candidato, informal em termos constitucionais mas formal pelos critérios do PS, não foi eleito. Daí, os anunciados critérios foram abandonados e aplicado o seu contrário. Assim que conveio, as coisas foram postas de pernas para o ar, o que nos dá uma imagem clara do que, para tal gente, significa a expressão “palavra honrada”.
Porquê, dois anos depois, voltar a bater nestas teclas? Porque, senhores, a moral republicana que animou a subida ao poder do “candidato a primeiro-ministro” vencido é a mesma que continua, dois anos depois, a reger a coisa pública.
A “palavra honrada” foi substituída pela propaganda, pelo torcer dos números, pela inversão das razões. As chamadas boas notícias foram obtidas, não pela acção do governo, mas apesar o governo. As descidas do défice (miseráveis se comparadas com as do governo legítimo) é a única boa notícia de que se podem valer, isto é, trata-se de um “mérito” que advem do garrote dos serviços públicos, das cativações tão cegas quanto brutais, do abandono do património nacional, da ausência de investimento público, da utilização das folgas fiscais para a compra de votos, da austeridade mascarada, dos erros fatais da política económica com efeitos de longo prazo.
A “palavra honrada” já mostrou o que vale. Os seus mais graves efeitos virão, quando a anestesia da opinião pública cessar e quando as condições externas abanarem. Tudo aponta para que baste um destes quandos.
15.3.18