PEQUENINOS E ESTUPIDINHOS
Muita gente vai a Bilbau ver o museu que ali foi construído com desenho de Franck Ghery, estrutura que se transformou em indiscutível ex-libris da cidade, e que representa, para ela e para a região uma monumental fonte de receita, directa e indirecta.
Lá está, bem patente, ou “transparente”, como se diz em politicamentecorrectês, quem financiou o projecto, quem pagou a obra, quem a gere, os seus resultados, etc.
Assinale-se antes de mais que a magnífica construção se fica a dever a um extraordinário fenómeno de coesão regional, comum em países de tradição anglo-saxónica mas não tanto na “latinolândia”. Os grupos económicos, os munícipes, as associações, os intelectuais, os mecenas aliaram-se às autoridades e conseguiram financiar uma infra-estrutura cultural e turística que atrai milhões de visitantes e de euros.
Foi preciso visão, arrojo, capacidade de realização. Mas os resultados estão à vista. Quem se lembrava de ir a Bilbau antes de o museu estar a funcionar? Só em negócios ou de passagem se conhecia a cidade, abafada por outras bem mais interessantes.
E por cá? Por cá houve um homem que teve uma ideia da mesma grandeza para Lisboa. Esse homem foi Santana Lopes. O local escolhido foi o Parque Mayer. Arquitecto, o mesmo de Bilbau. O financiamento, esse, era mais simples. Chegaria um casino (como os números já provaram) para prover à realização do sonho.
O que aconteceu? Antes de mais, o Presidente da República, dr. Jorge Sampaio, não deixou passar o decreto. Não por se opor a um casino em Lisboa, como se veio a provar, mas porque não queria “aquele” casino, não gostava “daquele” presidente da câmara, não queria “aquela” solução. Ou seja, uma birra. Ou (mais) um favor com que Sampaio nos brindou a todos. Depois, nacional intelectualidade foi pelo mesmo caminho, como era de esperar. O provincianismo bacoco costuma ganhar todas as batalhas. Apesar disso, Santana Lopes perseverou. Longe da pequenez sampaísta e da arrogância intelectualóide, tratou de arranjar uma solução que mantivesse o rasgo, a ambição, a visão de futuro, o respeito pelo futuro da cidade, a sustentabilidade do projecto.
São conhecidas as vicissitudes políticas que se seguiram. Não vale a pena rememorá-las. O que vale a pena é notar como o socialismo camarário veio a pôr o arquitecto na rua e a pedir uns projectinhos a uns gabinetes que para aí vegetam. Os resultados já começam a estar à vista. Não se trata de dotar a cidade de uma infra-estrutura que possa ser “atirada à cara” do mundo, como aconteceu em Bilbau. Trata-se, simplesmente, de proteger um mamarracho do modernismo salazarista (o Capitólio), de fazer mais uns apartamentinhos e uns escritóriozinhos, uns “equipamentos culturais”, e de “ligar” o Jardim Botânico à avenida da Liberdade. É evidente que a coisa vai primar pela inviabilidade, pela insustentabilidade, pela degradação. Isto se a chegarem a fazer.
A pequenez mental triunfou mais uma vez. Não haverá remédio?
António Borges de Carvalho