COMEMORAÇÕES
Aqui há dias, diz-se, foi “comemorada” a “língua portuguesa”. Não sei quem, que autoridades, que universidades, que academias, que gramáticos, que outros, se dedicaram a tal e tão nobre tarefa. Nem em que consistiram os “trabalhos comemorativos”.
O que sei é que, em “defesa” da língua, há anos os portugueses se vêem obrigados a cumprir os ditames de um “acordo” que, além de totalmente burro é ilegal porque não ratificado pela esmagadora maioria dos seus subscritores. Não pode tal “acordo” deixar de ter óbvias e dramáticas consequências para os que falam, escrevem ou por outras formas utilizam a língua. Um “acordo” posto em vigor não se sabe com que fundamento jurídico, científico, social ou educativo. Um “acordo” que outras utilidades não teve que não as de fazer gastar inutilmente rios de dinheiro em manuais escolares e de lançar confusões na cabeça de toda a gente, ou seja, de todos os falantes e escreventes de português por esse mundo fora. Um “acordo” que não vigora, ainda bem, num só país africano de língua portuguesa. Um “acordo” que põe os brasileiros a fazer troça dos portugueses e os portugueses a odiar as “brasileirices” que lhes são impostas. Um “acordo” que põe em causa a credibilidade e a honra do país que à língua deu origem.
Todas as línguas europeias que saíram das suas fronteiras de origem sofrem, ou são enriquecidas, pelo seu uso noutras paragens. Não sei quantas versões (muitas) há, por exemplo, do inglês falado pelo mundo fora, sem que tal signifique, ou que as pessoas deixaram de se entender, ou que o inglês tenha deixado de ter a sua natureza original ciosamente guardada e enriquecida pelo tempo. O português tem uma versão brasileira, mas não deixa por isso ser português, queira-se ou não, goste-se ou não. Aliás, não há que querer ou não, não há que gostar ou deixar de gostar. Não é coisa boa nem coisa má. É o que é, e pronto.
O “acordo” veio confundir as pessoas de forma de tal maneira estúpida que só pode causar danos à língua, estropiando palavras e conceitos dos dois lados do Atlântico.
É sabido que o ensino e a fala do português em Portugal sofre horrores com a falta de educação linguística a todos os níveis. Da boca e na escrita de gente que se teria por responsável ouve-se e lê-se os maiores dislates que imaginar se possa, fonéticos, morfológicos e de sintaxe. Pleonasmos são aos pontapés. Verbos a concordar com o complemento directo não têm conta. Sujeitos indeterminados com o verbo no plural, já nem se dá por eles. Até as preposições mudam de sentido consoante a ignorância de escritores, jornalistas, políticos, académicos! E por aí fora. A Gramática é letra moribunda.
É facto que a língua é mal ensinada, estropiada e, sobretudo, desprezada. O “acordo” não é o único culpado. Culpados são os que deveriam amá-la em vez de, cinicamente a “comemorar”.
22.5.21