DEVORISTAS
No tempo em que vivíamos em ditadura, era-me descontado um por cento do vencimento a título de cota sindical. Nem sequer sabia a que sindicato se destinava o meu dinheirinho. Era obrigatório, e pronto.
Logo que chegou o 25, apressei-me a dar instruções para que a coisa acabasse. Estava-me nas tintas para os sindicatos, fossem eles salazaristas, democráticos ou comunistas. E lá passei a empochar o meu rico um por cento.
Depois, veio a “luta” pela “unicidade” sindical, coisa grata ao camarada Cunhal, para quem controlar o nascente movimento era fundamental para a gloriosa marcha a caminho da miséria, da fome e das demais benesses do “socialismo”.
Fui a todos os comícios e manifestações contra a coisa. Essa batalha foi ganha, e nunca mais me vieram ao bolso com tais fantasias.
Trinta e tal anos passados, um senhor que fuma havanos e dirige os sindicatos do PS, vem propor que ao pobre povo seja cobrado, queira ou não queira, uma importância qualquer, a título de pagamento das negociações dos contratos colectivos que o tipo faz com o governo. Quer dizer: na opinião do homem essa coisa de a cada um ser dado contratar livremente as suas condições de trabalho não deve existir. Assiste ao canalha o “direito” de representar quem lhe não deu procuração nem se filiou na sua organização. Perguntar-se-á em nome de que filosofia, de que cartilha, de que princípio advém a criminosa ideia. Perguntar-se-á qual é a noção de liberdade desta gente.
A resposta é simples. É óbvio que o homem jamais avançaria com esta história sem o acordo prévio do chefe. Por isso que a arrancada para sacar mais uns milhões tenha toda a lógica. Trata-se de aplicar a noção de liberdade individual que mora na mente privilegiada do senhor Pinto de Sousa.
Quem nem liberdade tem para usar uma colher de pau pode arrogar-se a liberdade de não pagar aos agentes do poder? É evidente que não.
António Borges de Carvalho