VAE VICTIS
Julgo que os chefes políticos, quando há eleições, têm sempre, pelo menos, dois discursos preparados. Um, para ser dito em caso de vitória, outro se as coisas correrem mal.
Com os intelectuais da bola passa-se coisa semelhante. Ouvimo-los, sempre em linguagem oblonga e neológica, a bolsar elogios idiotas quando as coisas correm bem, e a arrotar as críticas que lhes vêm à cabeça no caso contrário. É assim. Têm sempre razão.
Outra característica dos discursos desta gente – se são pensadores têm que saber a razão, a lógica das coisas – é a infalibilidade dos resultados. Os resultados são sempre justos, porque os pensadores descobrem sempre as razões profundas que os determinaram, mesmo que tais razões só estejam ao alcance de mentes profundas, que são as deles.
Os alemães praticaram um futebol oportunista, bacoco, violento e pobre de espírito. Os portugueses deram um espectáculo magnífico, de esforço e de classe. O futebol dos boches foi premiado, o nosso castigado.
É evidente que, pelo menos um dos golos germânicos podia ter sido evitado, se a nossa defesa tivesse estado à altura dos acontecimentos. É evidente, também, que um dos golos dos ganhadores foi obtido na sequência de uma falta não menos evidente. Também é evidente que os golos dos portugueses foram limpos, obtidos a jogar, bonitos, sem discussão possível.
Por isso que fosse de elogiar a equipa portuguesa, de lamentar a sorte dos que menos futebol sabem jogar, e de criticar os árbitros que deram aos tudescos o golo ilegal que os fez ganhar.
Nada disso sucedeu. Sobre a ignominiosa atitude dos árbitros, nem uma palavra. Sobre a luta insana e o futebol excepcional que a equipa portuguesa praticou, umas duvidosas migalhas. Não importa o que a equipa jogou, importa que “o Cristiano não estava nos seus dias”. Sobre a “justiça” da vitória nem uma palavra que não fosse de concordância e louvor.
Da turbas multas que esperneavam bandeirinhas da República pelas esquinas, “umas dezenas” foram esperar a equipa ao aeroporto.
Assim se vê como o patriotismo dos portugueses é forte, firme e profundo. Assim se vê como as “elites” da bola são inteligentes e criteriosas.
Vae victis.
António Borges de Carvalho