Manifs
A manifestação “generalista” de ontem, inspirada pelo PC, do tamanho do estádio nacional, e a de há dias, mais “pluralista”, dos professores, que encheria o do Belenenses, merecem alguma reflexão.
Uma e outra tiveram inesperada adesão, com a habitual guerra de números, uns a dizer que eram muitos, outros que não tantos, etc. Indiscutível é que foram expressivas e que não há quem lhes não encontre fundamentos, ou seja, quem não compreenda, à esquerda e à direita, as razões da turba-multa que se sente prejudicada pelas medidas do senhor Pinto de Sousa (Sócrates).
Para quem se sinta impressionado com as mobilizações conseguidas, uma realidade de sinal contrário deve entrar no prato da balança: as sondagens. Estas continuam a mostrar, clara e unanimemente, que o senhor Pinto de Sousa (Sócrates) continua firme à cabeça de todas as apreciações populares e ganharia, com larga margem e maioria absoluta as eleições, se as houvesse neste momento.
A democracia das urnas, que é a propriamente dita, diz o contrário da das ruas. Pinto de Sousa (Sócrates) está bem e recomenda-se, o eleitorado continua a apoiá-lo sejam quais forem as mobilizações do senhor Carvalho da Silva, alter ego do camarada Jerónimo, e as histerias dos professores, sedentos de diuturnidades e promoções à papo-seco.
É bom que as novas gerações, as que não assistiram à revolução leninista de 1975, percebam que, ao longo da história, muitos regimes mais ou menos decentes foram abatidos por manifs e substituídos por hediondas ditaduras.
Não é um mal em si que, quem o queira fazer, se manifeste nas ruas. O mal está em deixar-se impressionar por isso, ou deixar que as minorias barulhentas acabem por usurpar ou enfraquecer o poder democraticamente eleito.
Em Portugal existe, a título obrigatório, uma coisa abstrusa que se chama “democracia participativa”, uma cavilhasinha de “poder popular” deixada na Constituição, bem a jeito, pelos esquerdoidismos da época revolucionária. Em si, a expressão até é bonita. Mas parte de uma (propositada) confusão entre o direito que a cada um assiste de participar na vida pública – uma consequência da liberdade de pensamento e de expressão – e o exercício do poder, esse dependente e legitimado pelas urnas, que não pelas opiniões do dia-a-dia, por mais mobilizadoras que sejam.
Não me sinto feliz por ser governado pelo senhor Pinto de Sousa (Sócrates). Espero, quer dizer, tenho esperança que uma alternativa democrática o venha a apear, e quanto mais depressa melhor. O que não quer dizer que o homem, apesar de mentiroso e insuportável, não tenha todo o direito a exercer o poder. Desejo que se não deixe amedrontar pelas ruas e que perceba que não é delas que lhe vem a legitimidade.
António Borges de Carvalho