PRÓS E CONTRAS
O Excelentíssimo e Ilustríssimo Arquitecto Vereador Manuel Salgado, competentíssimo e coerentíssimo ajudante do presidente Costa, como já tinha sido da dona Maria José, apareceu nos “Prós e Contras” da RTP, alardeando a sua profunda preocupação com o repovoamento de Lisboa, com a situação dos inquilinos dos bairros históricos e com a reanimação do mercado de arrendamento.
O Arquitecto, bem nascido mas com generosa alma socialista, ainda não percebeu, coitado, que as pessoas que saíram da cidade já não voltam, isto é, que o senhor Isaltino e quejandos não só lhes arranjaram casa fora da cidade com providenciaram para que os empregos também se fossem embora.
Ainda não percebeu, coitado, que o NRAU, nos resultados do qual - socretinice oblige – está esperançadíssimo, não produziu nem produzirá efeitos de espécie nenhuma, isto é, que uma lei feita não para relançar o arrendamento mas para sacar impostos jamais será aceite pelos respectivos destinatários.
Ainda não percebeu, coitado, que não haverá recuperação urbana que se veja enquanto o Estado, a Câmara, seja quem for, não reconhecer que, se não há dinheiro para tal é porque o Estado, há quase um século, põe os senhorios, obrigatoriamente, a fazer de fornecedores de habitação pro bono e que é este, e não outro, o ponto de partida seja para o que for.
Ainda não percebeu, coitado, que terá que ser o Estado a prover, com o dinheiro que extorquiu, à tal reabilitação urbana.
Ainda não percebeu, coitado, que não há IMI’s a triplicar, ou posses administrativas, ou obras coercivas que valham.
Ainda não percebeu, coitado, que, enquanto houver alguma liberdade, as pessoas não alinham em catracas camarárias destinadas a arruiná-las ainda mais.
O senhor arquitecto vereador socialista, companheiro de bancada do Fernandes - o que diz quase tudo - nem sequer ouviu as sociólogas e os agentes económicos que com ele estavam na televisão e que, claramente, vituperaram a situação que se vive, não só nos bairros chamados históricos mas também nas avenidas novas (prédios dos anos 30, 40, 50, etc) em Benfica (prédios com quarenta anos ou menos) e por toda a cidade, onde os senhorios têm saldos de “exploração” cronicamente negativos.
Nem sequer ouviu que a morte, sim, a morte dos inquilinos é a única luz ao fundo do túnel do arrendamento e que, mesmo assim, como os ditos não morrem todos ao mesmo tempo, para colocar um prédio em condições para um arrendamento minimamente actualizado é preciso aos senhorios esperar anos e anos, depois ir aos bancos buscar o dinheiro que o Estado lhes roubou e pagá-lo com língua de palmo, na estulta esperança de que, um dia, a sua propriedade valha alguma coisa ou renda algum líquido.
Nem sequer ouviu falar da monumental diferença entre a renda que paga um jovem casal por um quarto com serventia de cozinha e retrete (350 euros) e a que paga o filho, o neto, a amante de um inquilino falecido há vinte anos por um andar de dez assoalhadas na Avenida da República (100 euros).
O autismo visceral e o socialismo “moral” que destruíram Lisboa está cada dia mais presente na cabeça, no coração, na alma de quem (des)governa a cidade. A sociedade resiste como pode. Abandona-a, vai à procura de outros mundos. Depois, vêm os salgados & companhia desbocar-se com projectos tontos e com mais injustiças e mais trafulhices legislativas.
Um apontamento final, sob a forma de pergunta: alguém percebeu as doutas explicações do senhor secretário de estado não sei de quê sobre como vai funcionar o sistema dos fundos que o governo quer criar e que a CGD, mesmo sem saber como, já se prontificou a lançar? Dou um doce a quem tiver percebido. A coisa é de tal maneira labiríntica que até parecia que o senhor Louça tinha razão, o que é uma contradição nos termos e pode confundir muita gente.
28.10.08
António Borges de Carvalho