O medo da verdade
SEPIIIRPPDAACS (Sua Excelência o Presidente da III República Portuguesa Professor Doutor Aníbal António Cavaco Silva) apresentou-se ontem na televisão – já veremos porquê – para tecer loas ao governo do senhor Pinto de Sousa (Sócrates), à tão badalada “consolidação orçamental”, e à excelência da forma como vêm a ser conduzidos os destinos da Nação.
Para quem ainda tivesse dúvidas, julgo que as coisas ficaram claras. Claríssimas. O atoleiro em que nos encontramos fica a dever-se a uma emérita trindade de excelências, a saber: Sampaio, Pinto de Sousa (Sócrates) e Cavaco, ainda antes de ser SEPIIIRPPDAACS.
Em 2005, era preciso pôr as coisas a jeito. Não se podia actuar sem que o PS e o PC resolvessem as suas crises internas. Pinto de Sousa (Sócrates) encarregou-se da tarefa no PS – e saíu-se bem. O PC organizou-se. A esquerda ficou pronta para o futuro.
Faltava acabar com o governo de então. Não era muito fácil, dado o sistema político em que vivemos, ou vivíamos. Daí que fosse necessário pôr os camartelos em acção. Várias personalidades se ofereceram para a nobre tarefa. Entre elas, ressalta o actual PIIIRP. Umas conferências, umas entrevistas, umas acções, umas omissões, e aí está a coisa atada. Sampaio tinha tudo para pôr o chouriço no fumeiro. E Zás!
Logo a seguir entrou em cena o senhor Pinto de Sousa (Sócrates) que, perante o olhar embevecido dos outros dois senhores, e mercê, entre outras coisas, da “campanha eleitoral” do professor, tomou o poder.
Restava a girândola final, cujo êxito dependia, mais uma vez, de Pinto de Sousa (Sócrates). O homem portou-se à altura. Deixou dividir o partido, abandonou o candidato oficial à sua sorte, virou costas ao candidato oficioso (Manuel Alegre prestou-lhe o inestimável serviço de dispersar os votos do PS), e aí está, SEPIIIRPPDAACS é eleito à primeira volta. Sem espinhas.
A trindade ganhou em toda a linha. A gratidão de SEPIIIRPPDAACS é manifesta: o que criticou a outros elogia a este. Sabido que é que SEPIIIRPPDAACS não é dado a gratidões, o futuro dirá o que disser. Para já, porém, a obra da trindade é um sucesso Para os próprios, entenda-se. Para nós é outra coisa.
Resta o porquê da entrevista.
Era sabido que Santana Lopes dava, na mesma noite, uma entrevista à RTP.
Parece evidente que SEPIIIRPPDAACS, a dar, nessa qualidade, uma entrevista, ainda por cima a primeira do mandato, o deveria fazer (mais que não fosse por respeito pelos cidadãos) a um canal generalista, com audiência nacional. Não. SEPIIIRPPDAACS vai dá-la à SIC Notícias, e até fora do horário nobre.
Como explicar a estranha atitude? Não é difícil. Havia que ocupar as primeiras páginas do dia seguinte e do fim de semana, a fim de não deixar que Santana Lopes tomasse conta delas. Tratou-se, pois, de numa mera manobra de (des)informação. SEPIIIRPPDAACS não tinha rigorosamente nadíssima de novo a dizer às pessoas. Que apoiava Pinto de Sousa (Sócrates) já toda a gente sabia. Não havia nenhuma circunstância particular que justificasse a intervenção. A não ser, claro, a entrevista de Santana, a que era preciso tirar impacto.
A acções, boas e más, são de quem as pratica.
Como lado positivo de tudo isto, registe-se o medo que a trindade em geral e SEPIIIRPPDAACS em particular têm de Santana Lopes. É que, tão bem como ele, a trindade sabe a verdade. E tem medo dela. Pudera. Para a obnubilar, vale tudo. Nem que seja preciso dar uma entrevista às onze da noite a um canal com 2% de audiência. Os jornais tratam do resto, não é?
António Borges de Carvalho