PRIVACIDADE E PUBLICIDADE
Dona Cância, aproveitando a abertura de que dispõe no DN (órgão oficioso do PS que usa da mais radical imoralidade jornalística quando se trata de ajudar o chefe), veio a lume com uma artigalhada – o dobro do espaço habitual, que já é demais – revoltar-se, coitadinha, contra o facto de as autoridades encarregadas da moral (republicana) dos profissionais da coisa não terem dado o devido provimento aos seus protestos contra o surgimento, na imprensa,de gente que a “acusa” de ser “namorada do primeiro-ministro”.
Trata-se, na opinião da ilustre plumitiva, de uma invasão da sua vida privada, um pecado sem nome. Há até, protesta com justa indignação, fotógrafos, a que chama paparazzi (quem é a senhora para se achar com direito a ser paparazzizada?), que a apanham, em locais públicos, na doce companhia do senhor Pinto de Sousa.
Brada aos céus, não é?
Não é, não senhor. Dona Cância é uma das mais ferozes defensoras da “liberdade contratual” entre homens e mulheres, mulheres e homens, homens e homens, mulheres e mulheres, e do mais que não me dou ao trabalho de imaginar. É uma acérrima prosélita das uniões de facto, dos namoros de alcova, de tudo o que, para ela, significa direito e respeito civil por tal direito.
Dona Cância deveria tentar perceber que o senhor Pinto de Sousa, namorado ou não, é primeiro-ministro do saco de desgraçados em que transformou o país. E que, em todo o mundo civilizado, as pessoas têm o direito, esse sim, um verdadeiro direito, de saber do estatuto civil dos seus dirigentes. Ora se as uniões de facto, as ligações de alcova, os namoros de toda a espécie, são, na opinião da dona Cância, iguais ao estatuto civil de “casado”, tais ligações, no caso dos políticos, tendo igual dignidade entre si, devem ser, como é óbvio, do domínio público. Se o Presidente da República é casado, dúvida não resta que as pessoas têm o direito a saber que assim é, quer dizer, o facto de o Presidente da República ser casado ultrapassa largamente o limiar da sua respeitável privacidade. Toda a gente tem direito a conhecer da sua situação civil, o que não significa que tenha o direito a saber o que se passa em casa do senhor. Se a dona Cância, como os seus escritos postulam, acha que a sua ligação com o primeiro-ministro tem a mesma dignidade que o casamento do Presidente da República, com que direito protesta contra o facto de haver quem o diga e escreva?
Terá, sem dúvida, tal direito, se o que dizem não for verdade. Mas se o é, não se trata de “vida privada”, não tem nada a ver com as festas que o Presidente da República faz, ou não faz aos netinhos lá em casa! Bem pelo contrário, é coisa tão pública como os projectos que o senhor Pinto de Sousa assinava lá nas berças.
O que a dona Cância devia fazer era informar as pessoas sobre a situação “marital” do primeiro-ministro. São amantes, ou não? Aqui está uma questão de inegável interesse público e pouco de interesse privado.
21.11.09
António Borges de Carvalho