ALEGRIAS
Depois do santarrão do Louça ter entronizado o beato Alegre, muito tem o homem esperneado a dizer que não é candidato do Bloco de Esquerda. Vá-se lá perceber a diferença política entre ser “apoiado por” ou “do”. A não ser que se trate do rimar de alguma quadra popular ou, tratando-se de tão celebrado poeta, de invernosa écloga, não se vislumbra a diferença.
Sofrendo a criatura, não tão alegre quanto Alegre, da ingente pulsão democrática que - apesar de aliado de longa data aos, à altura, inimigos militares do país - o levou a acompanhar os democratas em 75, não tem rebuço agora em preparar, cuidadosa e detalhadamente, o apoio de um dos partidos comunistas, dos quais, evidentemente, “não é nem será candidato”. De tal forma bem construída estava a marosca, que o Louça nem precisou de reunir a “mesa” da organização para propagandear o indefectível apoio das suas hostes ao declarado futuro candidato. Que não é o seu candidato!
O PC, a bem de formalidades de tipo soviético, apresentará um candidato próprio. O Alegre que trate de ir à segunda volta, ficando desde já garantido que os votinhos dos tovaritches irão parar, ainda que requentados, ao saco dele.
A seu tempo virá o Pinto de Sousa dizer que, após ouvir os quadros, as bases, o secretariado e o Lelo, decidiu que o PS, não como o BE e o PC, de quem o homem não é candidato, o nomeia seu desde a primeira hora. Aldrabice… O Pinto de Sousa foi entalado e bem entalado e, a não ser que aconteça algum milagre ou que perca a cabeça, não terá outro remédio.
Postas as coisas nestes termos, outra frente de combate está a tomar forma. Um pouco por toda a parte aparecem comentadores encartados e opiniosos de nome a chamar a atenção para as origens semi-aristocráticas do indivíduo (o nome dele é Mello-Duarte), para o seu gosto pela caça de elite e pelo tiro aos pratos, pela roupinha do “Picadilly” ou equivalente, e até, imagine-se, pelas suas tiradas, tão acéfalas como incoerentes, sobre “a Pátria”, “os descobrimentos”, “as tradições” e outras coisas que, ou não sabe o que são ou traiu quanto pôde.
Há também quem diga, talvez com razão, que a criatura é o candidato da mais “negra reacção”, desta vez juntando os comunistas (BE/PC) e a direita mais fundamentalista, que estão bem uns para os outros.
Entretanto, o futuro candidato, que não será do BE, nem do PC, nem do PS, nem de ninguém – é capaz de pensar que é de nós todos, t’arrenego! – continua, com aquela ar profundo e ribombante de Adamastor do quarto esquerdo, a dizer inanidades sem sentido nem correspondendo seja ao que for que não seja o desejo ardente de se candidatar à custa delas.
Triste é que um tipo tão gloriosamente oco ainda leve atrás de si seja quem for. Para além da Roseta, claro.
24.1.10
António Borges de Carvalho