DEFENDENDO O SENHOR PINTO DE SOUSA
O senhor Pinto de Sousa encontrou um inesperado defensor. Trata-se do comentarista e storytteller Tavares. Sempre impante da mais petulante originalidade e prenhe de “altura moral”, o homem a quem o “Expresso” entrega, e paga, uma página inteira todas as semanas vem dizer-nos:
a) Que a liberdade de expressão existe, pujantemente, em Portugal.
Pois existe. É por isso que querem dar cabo dela. Se não existisse não era preciso tanta guerra.
b) Que o Dr. Rangel fez muito mal em levar o assunto das escutas ao parlamento europeu, ainda que se tenha redimido com um bom discurso de candidatura.
Conceda-se.
c) Que está cheio de “nojo”, coitado, por causa das “verdades” (aspas dele) que têm vindo nos jornais e dos “atropelos sem vergonha do segredo de justiça”, que põem a nu coisas deveriam ser secretas, uma vez que, se não serviram para a justiça também não deviam ser servidas ao respeitável público.
Pois é, o interesse público não interessa, o que interessa é a “privacidade” de uns senhores que estão a ser criminalmente investigados e que conspiram na sombra para obter, via dinheiros públicos (e que fossem privados!) mudanças na orientação da informação.
d) Que os sindicatos judiciais não têm competência para se pronunciar sobre estas matérias.
Aqui, tem o homem razão.
e) Que acha muito bem que o director do JN tenha censurado o artigo do Crespo.
Pois é. É o mesmo que o director do “Expresso” devia fazer aos artigos do Tavares quando se espraiam em alarvidades e em acusações sem fundamento “legítimo”.
f) Que tem asco ao director do Sol e às suas diligências para salvar o jornal, sobretudo porque acusa “aos quatro ventos” as pressões governamentais a que diz, sem que seja quem for desminta, ter sido sujeito.
Claro como a água mineral. Os directores dos jornais devem adorar ser pressionados se as pressões vierem do sacrossanto governo. Devem agradecê-las e, em princípio, agir em conformidade. Se não agem em conformidade, devem agradecer que os banqueiros do governo os estrangulem financeiramente, em vez de ir à procura de investidores.
Posto isto, o nosso cronista cai em si. Lá que há fumo, há. Onde estará o fogo? E continua:
g) “Ultrapassado o asco e o nojo… fica o conteúdo e, esse, é inquietante”. “As escutas reveladas pelo “Sol” confirmam várias coisas”: a promiscuidade pública/privada, o papel das empresas públicas, etc., tudo aproveitado pelos boys para os mais terríveis malefícios. Coitado do primeiro-ministro. Os seus “amigos e protegidos” são “tão pouco recomendáveis como ele”.
O raciocínio é simples: os aparachiks de serviço são, acima de tudo, culpados de incompetência. Se fizessem as coisas como deve ser não eram apanhados com a boca na botija. O primeiro-ministro, por seu lado, ainda que não seja um tipo “recomendável”, foi, coitadinho, apanhado nas malhas que a incompetência dos áulicos teceu.
h) Depois, chega o cronista ao cerne da questão. Assim: “não tenho dúvida de que Sócrates engendrou, consentiu ou sabia… que a PT queria comprar a TVI… parece que pelas piores razões”.
Então, se é tudo uma vergonha, a violação do segredo de justiça, a publicação das escutas, o artigo do Crespo, etc., porque raio de carga de água se permite o Tavares fazer tais acusações ao primeiro-ministro? Era tudo verdade? Se era tudo verdade, manda o interesse público que viesse a público!
i) E lá vem a solução. Como o problema o é da incompetência dos boys, “aqueles meninos que Sócrates andou a colocar nas suas golden shares ou nas suas golden opportunities, têm que ser varridos imediatamente, sem apelo nem agravo”, já que “congeminam para o ‘chefe’ serviços que envolvem o compromisso de centenas de milhões de euros dos contribuintes”.
Corridos os boys, fica o problema resolvido. Impoluto e firme, o primeiro-ministro tem todas as condições para o cargo! Tem alguma culpa que os boys andem a congeminar para ele?
j) Finalmente, o nosso storyteller entra no coro dos que pedem a demissão do PGR.
De acordo.
Não se percebe, depois de tanto arrazoado, por alma de quem é pedida a cabeça do Dr. Pinto Monteiro. Se o seu “crime” foi o de proteger o primeiro-ministro… tão criminoso é ele como o Tavares.
Enfim, uma sibilina defesa do senhor Pinto de Sousa. Já não é a primeira vez mas, desta, o exagero cínico do Tavares sobe a grande altura.
14.2.10
António Borges de Carvalho