MEXERICOS
O IRRITADO sabe que vai ser muito criticado por escrever o que a seguir escreve. Mas é o que pensa, e este blogue é feito com o que pensa.
Ontem e hoje vimos assistindo, em infernal berraria, à devassa pública dos rendimentos e posses dos políticos: o que ganharam, o que possuem, o que declararam. É o que as almas correctas pensam dever ser posto a nu. Em nome da transparência. Em nome da vigilância democrática.
O IRRITADO, talvez por desactualização mental, acha que se trata da mais repugnante bisbilhotice.
Se é verdade, e muito bem, que os políticos devem, enquanto cidadãos, ter os mesmos direitos que os demais, nem mais nem menos, e que, em matéria de obrigações, enquanto políticos, mais que os outros, como se justifica, de um ponto de vista moral, que lhes seja cortado todo e qualquer direito a ter o que têm ou ganhar o que ganharam, direito que os demais cidadãos prezam e exigem.
Que declarem o que são coagidos a declarar, vá que não vá. Que tais declarações sejam tornadas públicas é um crime contra a privacidade da vida de cada um e contra a própria natureza do estado de direito.
Todos os mais importantes princípios da vida em sociedade, para não falar de certos direitos evidentes e até constitucionais, são espezinhados pela exposição pública de tais dados.
Como qualquer cidadão, os políticos devem ser investigados no seu património e rendimentos se sinais claros ou fundadas suspeitas houver de que se locupletaram com o que não lhes pertencia ou que cometeram ilícitos patrimoniais, fiscais ou de qualquer outra natureza. Negar-lhes o direito ao sossego e à discrição da sua vida pessoal se nada se tiver a apontar-lhes é o mesmo que inverter todos os ónus morais e jurídicos que dão alguma dignidade à cidadania.
Confundir a transparência democrática com devassa sem suspeita é criar um ambiente policial. Pior, é transformar todos os cidadãos em polícias políticos, em agentes de perseguição sem causa.
24.8.11
António Borges de Carvalho