Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

irritado (blog de António Borges de Carvalho).

O SOCIALISMO É A FILOSOFIA DO FRACASSO, A CRENÇA NA IGNORÂNCIA, A PREGAÇÃO DA INVEJA. SEU DEFEITO INERENTE É A DISTRIBUIÇÃO IGUALITÁRIA DA MISÉRIA. Winston Churchill

irritado (blog de António Borges de Carvalho).

O SOCIALISMO É A FILOSOFIA DO FRACASSO, A CRENÇA NA IGNORÂNCIA, A PREGAÇÃO DA INVEJA. SEU DEFEITO INERENTE É A DISTRIBUIÇÃO IGUALITÁRIA DA MISÉRIA. Winston Churchill

DOS MALEFÍCIOS DA REPÚBLICA

 
Ficou patente, durante a crise criada pelo Presidente Sampaio para expulsar o governo Santana Lopes, que o seu autor não tinha fundamentos sólidos para fazer o que fez. Arranjou umas desculpas mais ou menos esfarrapadas, ora uma ora outra, toda gente tendo ficado a perceber, concordasse ou não com a presidencial decisão, que a coisa era por demais discutível e que o Presidente Sampaio, não podendo justificá-la por preferências políticas, tinha as maiores dificuldades em o fazer.
Tanto assim que, mais de dois anos depois, o dr. Sampaio, prenhe de má consciência, ainda anda pelas capelinhas a perorar sobre o assunto. Desta vez, numa sessão qualquer, resolveu desculpar-se com a absurda ideia de que ao Presidente compete auscultar a vox populi e agir em conformidade. Se a vox populi não confirmar, nas urnas, as suas atitudes, então, diz ele, o Presidente fica com “cara de parvo e com vontade de se meter debaixo da mesa”
Se eu não fosse uma rata já muito velha, quem ficava com cara de parvo era eu, perante a clarividência desta afirmação.
Quer ela brilhantemente dizer que o Presidente é livre, perante sondagens, manifestações ou campanhas de imprensa, de achar que o governo em funções não goza de suporte maioritário e que, perante tal achamento, lhe compete dissolver o parlamento, já que não tem poder para demitir o governo. Os mandatos eleitorais tornam-se, assim, letra vã, e os mais elementares princípios do sistema cedem perante o que o Presidente acha.
Será que o dr. Sampaio defenderá a dissolução do parlamento quando o governo Pinto de Sousa (Sócrates) estiver em baixa nas sondagens ou for vítima de algum ataque do prof. Sousa? Parece que não.
O Presidente Sampaio colaborou activamente, de braço dado com a esquerda em geral e com a dupla Cavaco/Sousa em particular, para a formação de uma onda de opinião. Quando sentiu que a onda estava em alta, e que os partidos da sua áerea política (PS/PC) estavam devidamente preparados, cavalgou-a, assim provocando a substituição de um governo de outra cor por um da sua. Haverá quem ainda não tenha percebido?
 
O pior, porém, é que o dr. Sampaio, em vez de assumir com coragem as evidentes razões que o motivaram, continua, afanosamente, à procura de desculpas. A seu favor, diga-se que é bonito ter remorsos. Quer dizer que tem consciência. Contra ele, diga-se que o que fez, fez, não sendo bonito continuar a esbracejar justificações, cada dia mais absurdas.
Desta vez, veio o senhor contar uma longínqua história. Diz ele que não esteve de acordo com as alterações operadas na revisão constitucional de 1982, no que aos poderes presidenciais diz respeito. Votou-as “por disciplina partidária”, mas teve o cuidado de escrever um papel a dizer que discordava. É verdade. Em 1982, o dr. Sampaio, oriundo de organizações de extrema esquerda burguesa e bem pensante (GIS, IS, MES…), tinha migrado para ala esquerda do PS, ala que, entre outros constitucionais primores, impediu o fim da irreversibilidade as nacionalizações. Ala que queria, de braço dado com o General Eanes e com o PC, manter a tutela presidencial e militar sobre a democracia portuguesa. Apesar de vencidos, conseguiram que ficasse, na Constituição, o poder de dissolução. No entanto, julgo que até o dr. Sampaio concordará que o poder de dissolver o parlamento se reveste de uma delicadeza extrema e que o Presidente, empenhado em defender a Constituição e o sistema, se deve sentir compelido a pegar no assunto com pinças e a rodear-se das maiores cautelas. Se assim é, legitimamente se perguntará quais as fontes de interpretação da norma que o Presidente deveria consultar para fundamentar a sua decisão. A resposta é simples: a primeira de todas as fontes (a Lei consagra-o e não há quem discorde) é conhecer do espírito do legislador que consagrou tal poder. Não seria difícil: o espírito do legislador que aprovou as alterações está abundantemente documentado. É possível saber, sem lugar para dúvidas ou tergiversações, com que intenção e em que termos foi consagrado o poder de dissolução pela maioria qualificada que o deixou passar.
Mas o dr. Sampaio, certo de que por aí se não safava, vem agora confessar que as fontes foram outras. Antes de mais, a sua própria opinião, por escrito manifestada, contra a da maioria qualificada que aprovou as alterações, maioria de que, ainda que à contre coeur, fazia parte. Como se a sua opinião (vencida com o seu voto!), em 1982, tivesse a ver com a intrepretação autêntica da Constituição. A seguir, o dr. Sampaio refere um dr. Novais, seu consultor em Belém, o qual parece ter inventado o conceito de poder em dueto, não sendo claro o que vem nos jornais sobre quem seja o outro membro do dito. Finalmente, et pour cause, refere o dr. Sampaio a opinião, por certo isenta e científica, dos profs. Moreira e Canotilho, ambos membros da minoria vencida em 1982. Isto para não falar do eterno Duverger, que serve para tudo e mais alguma coisa quando se trata de “presidenciar” o sistema.
Quer dizer, e desculpem se me repito: o dr. Sampaio, ao lançar a bomba atómica, foi à procura de razões a toda a parte menos àquela onde devia ter ido. Porquê? Porque sabia que estava a tomar uma decisão contrária ao espírito e à intenção constitucionais. O facto de comentadores e cientistas do direito justificarem, com argumentos técnicos, as suas posições pessoais (como Novais, Moreira e Canotilho), não implica que a Constituição queira dizer o que os que a redigiram e aprovaram não quiseram que dissesse.
 
É muito feio o que o dr. Sampaio anda a fazer. Podia ocupar-se da caridade universal, que tanto o interessa, da gestão do Pavilhão Real das Necessidades, onde confortavelmente se acomoda, dos destinos do Sporting, que tanto ama, ou do que lhe viesse à cabeça. Não teria eu nada com isso. Mas andar para aí a confessar-se, insistindo na balela de que o golpe de estado constitucional não foi um golpe de estado constitucional, é coisa que me irrita.
 
Acrescente-se a recorrente história de que o Presidente "não é um corta-fitas", nem "a Rainha de Inglaterra", nem “o notário do regime”.
Pois não. E é pena. Não consta que a Rainha de Inglaterra seja um peso morto, ou inútil, no sistema Britânico. Bem pelo contrário, é a digna representante do Reino Unido, como tal universalmente reconhecida. Como os Presidentes da Alemanha ou da Itália, por exemplo (os “notários”, na opinião do sr. Sampaio), têm a distância, a altura e a dignidade suficientes para representar os seus países, sem se meter em querelas nem precisar de andar a fazer politiquinhas pelos cantos. Quem “manda”, no Reino Unido, na Itália ou na Alemanha, são os governos legítimos para tal apontados pelos respectivos parlamentos, e por eles apoiados, vigiados e criticados. E quem, nesses felizes paízes, representa a “República”, sem pendurezas circunstanciais, são a respectiva Rainha e os respectivos Presidentes. A ARainha mais que os Presidentes, mas isso é outra história.
 
Por cá, desgraçadamente, andam há muito os Duvergés e os “franciús” em geral a inquinar-nos a vida política e a fornecer desculpas aos torcionários do sistema.
 
António Borges de Carvalho

O autor

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2023
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2022
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2021
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2020
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2019
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2018
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2017
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2016
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2015
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2014
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2013
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2012
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2011
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2010
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2009
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2008
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2007
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D
  235. 2006
  236. J
  237. F
  238. M
  239. A
  240. M
  241. J
  242. J
  243. A
  244. S
  245. O
  246. N
  247. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub