MACABRO!
Quem concebeu a ideia de organizar uma sessão solene para assinalar o ano judicial terá pensado que tal sessão contribuiria para o prestígio da Justiça e do sistema judicial, para o respeito e a confiança do público em quem exerce a função. As mais altas instâncias, os mais confiáveis agentes da Justiça viriam, do cimo da sua dignidade e das suas vestes, lançar sobre o povo e o sistema a sua palavra de competência, dedicação e serviço.
Quem concebeu enganou-se. A III República transformou a celebração numa luta de galos, cada um mais repenicado na defesa da sua capelinha, cada um mais preocupado em fazer política que em servir a sociedade.
O bastonário dos advogados – um doido varrido – destilou o seu ódio ao governo e a tudo o que faça parte da sua agenda política. Durante anos, serviu-se do cargo para proteger o primeiro-ministro. Agora, utiliza-o para o efeito contrário, na pessoa da ministra da justiça.
O PGR, que ainda não percebeu que está no poder à custa da protecção política que prestou a dois governos, e da cobardia do Presidente e de mais um governo, continua a achar que devia ter mais poder, em vez de fazer e dizer menos asneiras.
O PSTJ veio determinar o que é “direito”, esquecendo-se que fez tudo o que estava ao seu alcance para negar direitos às pessoas mandando destruir provas em matérias do mais relevante interesse público. Tudo para justificar a manutenção dos “direitos” que a si próprio se atribui e metendo-se em matérias com as quais não tem nada a ver. Se quer dar lições, vá para as universidades.
A ministra veio defender a sua reforma, talvez a mais importante de todas as reformas do Estado. Coisa que pode e deve ser discutida, que pode e deve ser afinada e melhorada. O problema é que, se, no necessário diálogo, os interlocutores são os da sessão, não terá interlocutores, só inimigos, gente que não vê um elefante fora do adro da respectiva capelinha, gente que nada quer para além da defesa dos interesses corporativos, as mais das vezes mal interpretados e inquinados por vários egoísmos.
Duas notas positivas:
A primeira foi a ausência na sessão das sinistras organizações sindicais de juízes e procuradores. Algo me diz que, a continuarmos entregues aos actores actuais, um dia vê-las-emos por lá. Tarrenego! Por enquanto não. Ainda bem. Mais galos na capoeira, e os de pior qualidade, não!
A segunda, o discurso do Presidente. Apelou ao diálogo, à discussão, à concertação de esforços para melhorar as coisas e recuperar a eficácia e o prestígio da Justiça. Uma voz no deserto, é verdade, destinada a não ser ouvuda, mas ao menos alguém disse o que devia ser dito.
4.2.12
António Borges de Carvalho