CRITÉRIOS, LAMÚRIAS E PIEGUICES
Há para aí vinte anos, o Presidente Soares foi a São Tomé. Numa volta qualquer pela ilha, viu uma bela praia. Mandou parar a comitiva, despiu as calças e banhou-se, regalado, nas salsas e tépidas ondas. O pessoal, engravatado, suado e hirto, assistiu ao imperial banho. Os jornalistas não se cansaram de gabar o presidencial à-vontade, o informalismo da situação, a bonomia de tão alta personalidade.
Não muito depois, também o primeiro-ministro Cavaco Silva foi a São Tomé, mas em viagem particular com a família, de férias. Um dia, em fato de banho, na praia, resolveu tentar subir a um coqueiro. Desta vez, não só ninguém achou graça mas levantou-se um coro de críticas e de troças. Um sururu, uma chacota dos diabos.
Estas histórias, tão interessantes ou tão pouco interessantes, são chamadas à colação, não por causa das personalidades envolvidas, mas a propósito dos critérios dos jornalistas, das suas preferências, e da funesta influência que têm na formação da opinião pública, submetendo esta, não ao que se passa mas à forma como os jornalistas “noticiam” o que se passa ou passou. A verdade é que estas notícias provam à saciedade a mentalidade preponderante na classe. Fica a adjectivação ao cuidado dos leitores.
Agora, a peregrina história dos piegas e da pieguice.
Pedro Lomba lembra hoje no “Público” que o Presidente Sampaio considerava prioritário o combate à lamúria, aconselhava os privados a deixar-se de lamúrias e dizia que “não é com lamúrias que os problemas se resolvem”. Veio à carga com as lamúrias vezes sem conta. Jamais jornalista algum protestou contra as lamúrias do Dr. Sampaio sobre a lamúrias dos demais, jamais partido político algum se indignou por ouvi-lo chamar lamurientos aos portugueses, coisa que fez repetidamente, sempre que lhe deu na douta cachimónia.
Comparem isto com o escarcéu motivado pelo conselho de Passos Coelho a uns estudantes: que em vez de se defenderem com pieguices, lutem pela vida e pelo futuro. Em uníssono, multidões de jornalistas dedicam à coisa manchetes e reportagens e vomitam prolixas opiniões sobre o “insultuoso atentado” feito ao povo português pelo primeiro-ministro. Os partidos da oposição, acomeçar por essa coisa reles que se chama PS, repenicam-se em desabaladas críticas, virgens ofendidas na sua nobre honra.
Nem as lamúrias do Sampaio nem as pieguices do Passos têm importância de maior. Não merecem mais que duas linhas nos jornais, eventualmente a dizer que se trata de bons conselhos.
Importante, mais uma vez, é ficarmos com a noção de quem é quem, de quem fabrica verdades, de quem nos engana, de quem conta as coisas (ou as esconde) retorcidas – os jornalistas – e de quem, cobardemente, se serve da mentira para fazer... crítica “democrática” – os partidos da esquerda.
Quanto aos primeiros, mais uma vez peço aos leitores que apliquem os adjectivos que por bem tiverem. Quanto aos segundos, nada a fazer, cada um come do que gosta!
9.2.12
António Borges de Carvalho