POUPEM-NOS!
Esta semana trouxe-nos mais dois casos exemplares.
O primeiro, velho de treze anos.
Um rapazinho desapareceu em 1999. Andaram polícias em investigações, procuradores em acusações, advogados em arguições, juízes em considerações, testemunhas em perorações. Fez-se reconstituições, inquirições, acareações. Resmas de papéis, centenas de jornais e não sei que mais foram pintados com tinta.
Treze anos depois, o caso foi julgado. Em primeira instância! Daqui a meses, ou anos, a Relação pronunciar-se-á. A seguir, meses ou anos passados, virá o Supremo dizer de sua justiça. Quando, finalmente, o Constitucional entrar em acção, o rapazinho, se estiver vivo, terá cabelos brancos e dentes postiços. O processo transitará em julgado - se algum dia transitar. Isto, se o julgamento da primeira instância não tiver sido declarado nulo por causa de um pinchavelho qualquer.
O segundo, mais novo.
Terá só uns nove anos ou coisa que o valha.
Uns rapazinhos terão sido usados por uns velhotes em orgias de mariquice, uns em Elvas, outros, ou os mesmos, em Lisboa.
Entram em acção os especialistas acima citados. Correm rios de tinta, horas de telejornais, centenas de entrevistas. Publica-se livros. As testemunhas, credíveis contra uns, são consideradas não credíveis quanto aos do PS. Um juiz vê a vida estragada por causa de um “erro grosseiro” legislativamente criado à sua medida. Os episódios multiplicam-se, patéticos, ininteligíveis e chatos.
Uns seis anos depois, mergulhado em confusões, truques de algibeira, requerimentos, depoimentos, esclarecimentos, comunicados, entrevistados, culpados ou não culpados, lá vem a decisão da primeira instância. A malta respira de alívio, que aquilo já não interessava a ninguém. Vêm os recursos. Mais um ano ou dois. A Relação manda uma parte de volta à primeira instância e confirma o resto. A seguir, virá o Supremo. Depois, o Constitucional, o Tribunal dos Direitos do Homem, o diabo a quatro.
Entretanto, a parte que voltou para trás ainda deve andar às voltas na primeira instância.
A decisão final, é legítimo calcular, será obtida no decorrer do século XXI.
Daqui o título deste post. Poupem-nos! Poupem-nos a estes espectáculos! Poupem-nos à vergonha de, num Estado dito de Direito, não haver quem acredite na Justiça!
Desenrasquem-se e desenrasquem-nos. Poupem-nos à terrível visão da vossa incompetência, ainda mais terrível porque “justificada” pela Lei, coisa em que seria suposto poder confiar.
Afinal, se há austeridade económica, porque não há-de haver austeridade jurídica e judicial?
24.2.12
António Borges de Carvalho