ENERGIA E "DIREITOS"
No princípio dos anos oitenta do século passado, houve uns deputados que conseguiram fazer passar uma lei que abria aos cidadãos a possibilidade de produzir electricidade para seu consumo.
A lei passou, mas, como é costume, não foi regulamentada. Portanto, o “direito” que instituía não era praticável, já que só o seria em condições técnicas específicas, por óbvias razões de segurança técnica e ambiental. A companhia da electricidade do tempo não gostava da ideia, como é de calcular, por razões de concorrência e de defesa do seu monopólio.
Passar-se-iam anos sem conta até que, não sei se por aplicação da tal lei se por outro motivo qualquer, do tipo “liberalização”, lá passou a ser possível produzir energia em casas particulares, indústrias, etc.
Muito bem? Não. Muito mal. É que, se se quiser pôr uns painéis foto voltaicos, um pequeno moinho de vento, um burro às voltas a uma nora ligada a um gerador, o produto da coisa é obrigatoriamente vendido à distribuidora e o valor da venda creditado posteriormente na factura, ou coisa que o valha.
Evidentemente, o sistema foi vendido às pessoas como uma espécie de mina de ouro que lhes era generosamente posta à disposição. Você investe na produção de energia, nós arranjamos o financiamento em suaves prestações e, ao fim de n anos, você começa a ganhar dinheiro que nem um nababo.
Então, e se eu e o meu vizinho comprarmos a meias o tal equipamento, e produzirmos só o que necessitamos, não tendo sobras, só, por vezes, faltas a colmatar pela energia da rede, por que carga de água somos obrigados a entrar no esquema da distribuidora?
É tudo para seu bem, meu caro, tudo para seu bem. Esquemas é connosco, não consigo e com o vizinho, está a perceber? A coisa tem que ser controlada, a fim de que, nem você venha a ter falta de energia, nem que venha a produzi-la para deitar fora. Temos aqui o regulamentozinho, o equipamentozinho, o financiamentozinho, o fornecedorzinho, o fiscacalinho, tudo preparadinho para si. E a tenebrosíssima CERTIEL. Uma maravilha.
E mais. Você só pode produzir se houver megawatts “disponíveis”. A licença tem limites! Não queria mais nada? Pode haver vento disponível, sol disponível, burros disponíveis, mas, se não houver megawatts, não há nada a fazer. Talvez em 2014…
Além disso, ao mesmo tempo que o preço da electricidade que você compra aumenta, o preço da electricidade que você vende ou é obrigado a vender diminui! Está a ver a lógica disto?
O resultado é que o exercício do “direito” que uns malucos quaisquer inventaram nos idos de oitenta não tem nada a ver com a sua liberdade de o exercer. É coisa que depende da soberana vontade daqueles de quem você, com a sua energia, se queria livrar.
Assim são os tempos.
12.8.12
António Borges de Carvalho