POUCA VERGONHA
Lisboa, 30 de Agosto de 2912
Estimado primeiro-ministro
Deixemo-nos de cerimónias, é assim que se trata as pessoas nos nossos dias – as Excelências acabaram, as Vossas Excelências, por maioria de razão, também, os excelentíssimos senhores nem pensar. Estimado, e é um pau. Se a dona Cristas chegasse onde você chegou, até já se ia ao PR, a Belém, de biquíni e jines, e tratava-se o homem por Senhor Aníbal.
É a vida. Aguente-se v., que eu faço o mesmo quando o jagodes do contínuo da retepum abre a porta e diz: ó presidente! Fique v. com o “estimado”, caro Pedro, e está com muita sorte.
Vamos ao que interessa.
Antes de mais, devo dizer que, se julga que se vai safar desta, está muito enganado.
Sabe tão bem como eu que os que devem muito dinheiro nunca pagam, isto é, como os credores têm medo que eles não paguem nada, ficam à espera de sacar qualquer coisinha, e assim se resolve o problema a longuíssimo prazo e a contento de todos. Olhe o que o Soares fez ao Nabeiro e o que (não) vai acontecer ao Berardo.
Aqui, na retepum e na dois, é mais ou menos a mesma coisa. Trata-se de serviço público, como diria o camarada Soares, ou de uma pouca vergonha, como anda um tal Irritado a dizer. O que vale é que vozes de burro não chegam cá a casa, não é?
O Pedro mandou o Borges pôr a boca no trombone e olhe no que deu. Não há quem não lhe dê porrada, sejam os do costume, a começar pelo Soares e pelo Jerónimo, a continuar no Marcelo e no Capucho e a acabar nos inefáveis adeptos do Portas. A opinião pública, mercê da argolada do Borges, está completamente virada do avesso, os comentadores e jornalistas sem excepção repenicam opiniões contra o Relvas – v. está a tentar passar entre os pingos da chuvada – e é tudo. Daqui, mais uma vez lhe garanto que não se safa.
A provar o que digo, tratei de pôr os pontos nos is mediante a requisição de mais 81 milhões, como rezam as notícias de hoje de manhã. Não se assuste para já. Olhe que vai ser muitíssimo pior. Guarde o susto para mais tarde. Para já, venha de lá a massa, que a minha malta – uns dois mil marmanjos – não faz a coisa por menos. É que o salário médio cá na casa é de cerca de seis ordenados mínimos (uns cinco milhões por mês mais coisa menos coisa), e a malta ainda há-de, com todo o direito, pedir os aumentos que lhe são devidos. Está a perceber?
Por isso, estimado PM, meta a viola no saco. Eu até já disse que, a partir de 2013, esta coisa vai dar lucro. Os tipos do costume acreditam e acham que as minhas afirmações são indiscutíveis. Mesmo que achassem o contrário, continuariam a tecer-me loas. Estou na mó de cima e nela faço tenções de me aguentar.
Isto é um país socialista, não é nada daquilo que você sonha. Você contabiliza os meus prejuízos e eu trato de mim e da minha malta como deve ser: bem. Também não tenho nada de socialista, mas dou isso de barato. O que interessa é o meu, percebe?
Poderia dar-lhe mais uma série de razões para demonstrar como vai perder este jogo. Mas não vale a pena. O camarada Paulo Portas já o condenou. O rapaz é mais “social” do que aparenta, percebe?
Vai ver. Quando esta marmelada chegar ao fim, vai ficar tudo mais ou menos na mesma, o que muito me agrada. Como não há quem queira comprar esta porcaria, e como a intelligentsia socialista nacional não vai em concessões, que outro futuro é possível?
Bem pode o Borges - bem poderia você - demonstrar por a+b que a ideia dele é a melhor, que continuariam a levar porrada na mesma. E digo-lhe mais: seja o que for que venha a acontecer, v. continuará a levar na cabeça como um herói.
Quem tem a pouca vergonha de se meter com os instalados e com o socialismo, … não digo o que lhe acontece, mas estou certo que será capaz de completar a sentença com toda a propriedade.
E boa tarde, caro PM
Seu amigo do peito
(assinatura ilegível)
Presidente da TV e da emissora nacional
30.8.12
António Borges de Carvalho