ESTADO SOCIAL
Há direitos e direitos. Numa acepção clássica, temos os direitos inerentes à pessoa humana, gratuitos, que nascem com ela: o direito à vida, à liberdade de pensamento e de expressão, o direito de voto... direitos de que se goza independentemente da circunstância de cada um. Modernamente, foi criado outro tipo de direitos, os chamados direitos sociais, que têm natureza diversa, longíssimo do conceito de direito propriamente dito: é que custam dinheiro! Nesta matéria, a nossa Constituição deve ser a mais pródiga do mundo. Todos temos direito a habitação (e não é a uma habitação qualquer), à saude tendencialmente gratuita, ao ensino universal e gratuito, a inúmeras prestações sociais, e por aí fora... só que, para ter direito a tais “direitos”, temos que os pagar! Pagamos o andarzinho onde vivemos, via renda ou empréstimo, pagamos livros escolares, pagamos a segurança social e a saúde via descontos no montante a que o nosso trabalho nos dá direito. Obrigatoriamente. Tudo sem que tenhamos o direito de ter uma palavra a dizer, o direito à escolha, o direito a qualquer espécie de opção sobre a nossa vida e o nosso futuro. Tudo sem qualquer correspondência entre aquilo que pagamos e aquilo que recebemos. Tudo nacionalizado, tudo utilizado pelo Estado a seu bel prazer para os fins que entende, e não gerido como devia, isto é, aplicando o nosso dinheiro e o dinheiro que a sua gestão rendesse aos fins para que o “depositámos”, compulsivamente, nas mãos do Estado. É isto o que se chama Estado social, numa concepção socialista e, desgraçadamente, constitucional.
O resultado, de um ponto vista civilizacional, foi a criação de uma sociedade de irresponsáveis - todos o somos -, confiantes num mastodonte com quem o diálogo é impossível: o Estado “social”.
É claro que, quando tal Estado chega ao estado em que está, desaparecem os direitos, ou seja, aquilo a que tínhamos o direito de pensar que tínhamos direito. Não temos. Se nos competisse gerir pelo menos a maior parte da nossa “segurança social”, se calhar éramos mais responsáveis e mais previdentes. Confiaríamos em quem nos oferecesse confiança, não em quem nos obriga a pagar, coarctando-nos a liberdade e proibindo-nos as opções.
O Estado poderia entrar em cena para colmatar problemas nossos, provenientes de problemas daqueles a quem tínhamos confiado a nossa saúde, a nossa reforma, etc.. Os responsáveis seriam os interessados, não a burocracia estatal, não a “gerência” estatal de tudo e mais alguma coisa.
O Estado assumiu tudo. E, falido que está, não retribui, nem pode retribuir, agora, aquilo a que se comprometeu, nem está em posição de ajudar aqueles que obrigou a pagar. Por isso que a solução do problema, se houver solução, não possa deixar de passar por uma espécie de revolução cultural, a revolução da responsabilidade individual e da profunda reforma do Estado. Numa palavra, uma revolução que ponha cada um no seu lugar. Um trabalho para décadas, impossível de realizar enquanto o “social” for confundido com socialismo.
Li há dias que nada há de mais inconstitucional do que o Estado. Se temos que comprar ou alugar casa, é porque o Estado, à revelia dos “direitos” que o socialismo inseriu na Contituição, não nos deu uma casa digna, como é sua obrigação. E por aí fora, no que respeita aos restantes “direitos” sociais. Se o Estado não os garante, nem jamais pode garantir,não está a cumprir a Constituição. O que bem revela a natureza demagógica, ultra-ideológica e fatal da nossa Constituição.
Se o Estado é, com geral aceitação, o primeiro dos ofensores da Constituição, por que carga de água anda para aí tanto miranda a esgrimir com ela para os seus paralisantes e pouco inteligentes fins políticos?
Dir-se-á que a posição do IRRITADO é maximalista e irrealista. Talvez seja. Mas, se não tivermos este tipo de ideias e objectivos como guia da nossa concepção do Estado, da sociedade e da natureza da Natureza Humana, não deixaremos a quem nos vier a substituir nada que, substancialmente, valha a pena ou tenha futuro.
15.12.12
António Borges de Carvalho