ARTES PLÁSTICAS E PODER POLÍTICO
Há coisas que fazem uma confusão dos diabos.
Parece que um tal Pais do Amaral, fulano que conheço dos media, mas que nunca vi mais gordo e goza da minha soberana indiferença, tinha um quadro pelo qual lhe ofereceram uns milhões. Vendeu-o. O quadro terá ido para França.
Por todos os lados se levantam vozes indignadas. Que não pode ser, que se trata de património inexportável, que o Estado devia impedir o negócio, etc. e tal. Mais. Que o governo, por decisão de um Viegas que parece que foi secretário de Estado, deixou sair a tela. Um horror, uma ofensa à Pátria, etc.e tal.
Punhamos as coisas no sítio. Ninguém põe em dúvida que o quadro estava legitimamente nas mãos do tal Pais do Amaral. Era de sua indiscutida propriedade. Se o Estado, ou a nacional bem-pensância, não queriam deixá-lo passar a fronteira, então que o comprassem pelo preço oferecido pelos estrangeiros. Se não podiam comprá-lo, o que se compreeende, como é possível que tivessem legitimidade para impedir o proprietário de o vender a quem quisesse? Facto é que parece que a têm. Senão não teria sido precisa a autorização do Viegas, não é?
Por outro lado, que diferença faz à Nação que a obra esteja em França ou nas paredes da sala do Pais o Amaral? Diferença, poderá fazer ao dito e aos amigos que lá iam a casa. À Nação, nenhuma. Pelo contrário. Entram uns milhões. Parece que o fulano gosta de investimentos, coisa que o governo adora, a oposição ama e toda a gente recomenda.
Facto é que ninguém sabia da existência da preciosidade em causa. Facto é que tal preciosidade só passou a existir no momento em que o governo, o qual delendus est, decidiu autorizar a exportação, em nome não se sabe bem de quê. Facto é que isto de ter coisas boas, para além de terrível pecado, põe quem as tem sob a alçada de quem se acha no direito de as fruir sem pagar. Facto é que o Estado republicano e socialista e laico, não deve, na opinião dos nacional-pensadores, respeitar a propriedade de cada um, mas sim controlá-la, taxá-la, imobilizá-la, e até apropriar-se dela se lhe der na realíssima gana. Entre outras coisas, é disto que nos devíamos livrar.
4.5.13
António Borges de Carvalho