ALIA JACTA EST
Fazendo jus à nobre tarefa a que se dedicou, o doutíssimo Tribunal Constitucional, em mais uma clara demonstração de amor à Pátria, declarou (sem apelo possível) inconstitucional o corte nas pensões que o governo queria instaurar com o fim de cumprir as obrigações internacionais que os desmandos de outros determinaram.
Nas palavras do dito tribunal, tal chumbo ficou a dever-se à absoluta necessidade de respeitar “o princípio da confiança”, conforme expresso no artigo 2º da Constituição. Consultado tal artigo, verifica-se não constar dele tal princípio. O que quer dizer que, na falta de melhor, se criou um “princípio”, até agora não expresso, mas que o distinto órgão de soberania considerará implícito. O que quer dizer que a Constituição é interpretada a la carte, isto é, quando se quer chegar a uma conclusão política, considera-se implícito o que se revelar útil para “justificar” a decisão. É assim deitado para o caixote do lixo o princípio da certeza jurídica, coisa que, convindo, parece que o TC revoga a seu bel prazer.
Interessante também é verificar que o “princípio da proporcionalidade”, esse expresso, não se aplica ao caso, pelo menos no glorioso parecer do TC... e com certeza para grande desgosto do doutor Cavaco, que quereria servir-se dele para defender a sua querida pensãozinha.
Muita gente ficará contente com a decisão, julgando que o ano de 2014, afinal, vai ser porreiro.
O problema deste tipo de ilusão é ser ilusão.
Os jornais, especializados e generalistas, europeus, americanos e patagónios, são unânimes sobre o que vai acontecer: os impostos vão aumentar, os juros vão dar pulos de corça pela escada acima, o “ajustamento” vai falhar, a confiança internacional vai morrer, os mercados vão fechar-se em copas, as próximas emissões de dívida vão ser um flop, os objectivos próximos do país não vão ser atingidos, etc.. Como é evidente, os parvos que agora estão contentes vão pagar mais caro do que as previsões mais pessimistas podiam levar a pensar. O pior é que os outros também, pensionistas incluídos.
A pataratocracia provinciana que anima tantas almas continuará a tecer loas ao TC. O nosso pântano é tão intelectual como financeiro. Ou mais.
20.12.13
António Borges de Carvalho