DA OBLITERAÇÃO DA INTELIGÊNCIA
Há pessoas estúpidas, rezam os manuais.
Outras há, que não o sendo, têm crises.
Outras ainda (caso menos comum) deixam-se levar por sentimentos menos nobres, de tal forma que até parecem estúpidas.
Vem isto a propósito do semanário que dá pelo nome de “Sol”, o qual, algumas vezes, o Irritado tem apodado de “Sólcrates”.
No Sábado, o “Sol” levou ao paroxismo o ódio rebuscado que nutre por Santana Lopes, calcando a inteligência e o distanciamento que qualquer análise minimamente isenta imporia. Tanto o ilustre arquitecto seu director como o seu vice Lima se dedicam a dizer cobras e lagartos do senhor, estendendo-se a sanha persecutória a um desconhecido de nome Ramires, que tem no “Sólcrates” trono permanente por razões que a razão certamete desconhecerá.
Ele é o artigo de fundo, rancorosa diatribe. Santana Lopes, “macaco de rabo pelado”, que Menezes “teve que engolir” e que “vai trabalhar para si próprio”, terá que ser “vigiado” pelo líder. E, como “engoliu” Santana Lopes, alijou os bons e rodeou-se de “gente de meia idade” (da idade do Saraiva). Como não conseguiu convencer a dona Manuela, perdeu o apoio de Cavaco. Dona Manuela não será de “meia idade”? Meter gente de meia idade, para o ilustre plumitivo, é uma desgraça, a não ser que a meia idade seja daqueles de quem acha que se deve gostar.
Ele é o “Sol e Sombra”, do senhor Lima, em que Santana aparece ao sol pelos piores motivos, ficando Menezes na sombra por causa de Santana, e Sócrates ao sol deslumbrante da glória.
Ele é o tal Ramires que, não fazendo a coisa por menos, perora sobre o “veneno” da “serpente”, cheia de “muitos pecados” (Santana), que Menezes “aconchega ao peito”.
Nas entrelinhas, e não só, o elogio aos “notáveis” que, olimpicamente, se quedaram longe do congresso, à espera de melhores dias.
Saraiva e Lima, quando eram empregados do “Expresso”, dedicaram-se a demolir Santana Lopes, semanalmente, sistematicamente, metodicamente, ferozmente. Com a ajuda de Marcelo, Cavaco e tantos outros “notáveis”, conseguiram os seus fins. Já Santana Lopes estava longe do poder, e ainda, um e outro, se dedicavam, sempre que podiam, a propósito ou a despropósito, à sua nobre missão. Era preciso mantê-lo morto e enterrado. Vá lá saber-se porquê.
O que os distintos opinadores, com a inteligência obliterada pelo ódio, não conseguem perceber, é que o PSD, nas horas mais importantes, nunca ligou muito a “notáveis”. Preferiu (quase) sempre os que lhe falavam à alma, ao instinto e, no fundo, à inteligência, uma inteligência que não terá muito a ver com a dos notáveis, mas que nasce de coisas simples, certas, e sérias. O PSD tratou como tratou as “elites” que se revoltaram contra Sá Carneiro, os “notáveis “ que preferiam Salgueiro a Cavaco, os “esclarecidos” que achavam que Santana Lopes não devia ser Primeiro-Ministro. Mandou-os às urtigas.
É verdade que, ajudados por saraivas, limas, marcelos, cavacos e quejandos, os “notáveis”, os “barões”, as “elites”, conseguiram demolir Santana Lopes.
Se os “sólcrates” da nossa praça não fossem informados por sentimentos que me absterei de adjectivar, e se recorressem à inteligência de que, lá no fundo, são dotados, talvez percebessem o que as pessoas pensam e desejam, em vez de as querer empurrar para os braços da “classe” a que pertencem, ou a que gostariam de pertencer.
O sono da razão engendra monstros. Não é?
António Borges de Carvalho