Concertações
A fim de "concertar" os contornos da missão militar portuguesa no Líbano, o PM Pinto de Sousa (Sócrates) vai reunir com o PR Cavaco Silva. O país contempla, e acha bem, já que a informação de que dispõe não opina de outra forma.
Permitam-me que, deste humilde cantinho, me revolte contra a coisa:
Primeiro, porque nada, na Constituição ou na Lei, prevê tal "concertação".
Segundo, porque a decisão de participar na força da ONU já foi tomada. Se já foi tomada sem consulta ou "autorização" do PR, então porque carga de água vai o PM "concertar" a coisa com ele? Será que o PR, além de armado em "comandante", agora também se debruça sobre questões técnico-militares? Não tem a ver com a decisão de participar, mas é ouvido para opinar se se deve mandar uma fragata, um batalhão de engenharia ou uma ambulância?
Compreender-se-ia que o governo, por uma questão de cortesia, isto é, sem a tal ser obrigado pela Constituição, ouvisse a opinião do PR sobre se devemos, ou não, integrar a força da ONU. Se tal não foi tido por útil, e se a decisão foi tomada pelo governo não tendo ao PR sido dada outra oportunidade senão a de dar, para português ver, alguns anodinos conselhos, então porque carga de água se vai "concertar" com ele os contornos da coisa? Ou o PR aceita a "desautorização" que a decisão representa, ou representaria se ele tivesse autoridade na matéria, e então "come" as sobras, sendo consultado, não para decidir mas para acertar pormenores, ou então teremos que chegar à conclusão de que o PR é uma espécie de conselheiro técnico do Governo, situação em que o espertalhuço do PM parece querer colocá-lo e que ele parece querer aceitar.
Pode argumentar-se que, se as coisas vão passar pelo Conselho Superior de Defesa Nacional, então o Doutor Cavaco, como seu Presidente, terá que ser informado sobre as matérias que nele irá discutir. Porém, o CSDN não é mais que isso, um conselho que aconselha, não uma instância que decide. E o PR, nele, também não é mais do que isso, um chairman a quem não compete qualquer decisão.
Continuamos, pois, a fomentar a confusão institucional que o dr. Sampaio inaugurou quando, com o consentimento do dr. Barroso, se armou em "Comandante". Coisa que é, não só claramente inconstitucional, como aponta para indesejáveis conflitos, num momento, não de todo imprevisível, em que as duas partes (PR e PM) tenham opiniões opostas.
A ver vamos se não é desta.
António Borges de Carvalho