DA ESTUPIDEZ DO RESPEITÁVEL PÚBLICO
Isto de ser pouco inteligente é uma maçada. Sobretudo quando uma pessoa tem, como elementos de comparação, figuras tão gradas como os ilustres membros do governo, os juízes ou os senhores do ministério público. É tal o brilho destas privilegiadas mentes, que o cidadão fica ofuscado, cego, incapaz de as entender.
Senão, veja-se o que se tem passado nos últimos tempos.
Primeiro:
- Com o habitual parangonismo, o governo da Nação fez passar um diploma no qual, alegadamente, põe os magistrados em situação “laboral” paralela, ou igual, à dos funcionários públicos;
- As doutas classes atingidas pela medida desdobraram-se, como o Irritado já referiu, em indignadíssimos protestos, gritando que lhes estavam a dar cabo da “independência”;
- Sua Excelência o Procurador Geral da República deu uma entrevista a uma revista qualquer, dizendo cobras e lagartos da iniciativa governamental.
Segundo:
- O governo parece que meteu no orçamento uma norma qualquer destinada a derrogar o que tinha legislado;
- O procurador Geral da República disse à rádio e à televisão que, afinal, as cobras eram taínhas e os lagartos lagartixas;
- O ilustre presidente de um sindicato de magistrados vem dizer que a sua organização vai aderir à greve da função pública, já que “tudo o que se passa com eles nos afecta”;
- Um ex-juiz do Tribunal Constitucional vai vai dar uma conferência de imprensa lado a lado com os tipos da Intersindical.
Afinal, pergunta o estúpido cidadão:
- Os magistrados são funcionários públicos ou não são funcionários públicos? Ou é à la carte, isto é, quando lhes convém, são (caso da greve), quando não lhes convém, não são (caso da carreira)?
- Qual é a posição do senhor PGR? A que a revista publicou ou a que disse à rádio e à televisão? São lagartos ou lagartixas?
- O que é isso da independência dos magistrados? É a que lhes é conferida pela irresponsabilidade do acto de julgar, ou pela auto-gestão?
- Quem cumpre a Constituição? O governo (quando diz que é preto), o governo (quando diz que é branco), a CGTP, o PGR? Quem? O que diz, afinal, a Constituição? Quer dizer o que diz, ou quer dizer outra coisa? O quê?
E é assim que o cidadão, estupidamente, acha que há altas classes, neste país, que perderam definitivamente o bom senso, que se não dão ao respeito, que são iguais aos demais e que, com isso, defraudam as pessoas que ainda insistem em ter nelas alguma réstea de confiança.
António Borges de Carvalho