Consensos
Quando as pessoas querem fazer o que gostavam de fazer, mas não podem, entretêm-se com palavras. Querem descansar a consciência, talvez cumprir promessas, inventar ou re-inventar um poder a que se julgam com direito, dar conteúdo ao que pensam vazio, dar-se importância, ver-se ao espelho dela.
Não sei se é isto o que se passa com o neo-central bloquismo do Senhor Presidente. Se não é, parece. Havia um tipo que dizia que, em política, o que parece é. Talvez tivesse razão.
O doutor Cavaco Silva desdobra-se, por isto e por aquilo, em propostas de consenso entre o PS e o PSD.
Talvez tenha razão no que propõe. Talvez haja reformas que devam ser feitas com garantias de longo prazo.
Mas, para um velho que, como eu, recorda que o doutor Cavaco:
a) fez campanha, em 84/85, contra o bloco central;
b) construiu o seu poder por via da contestação, e da condenação, do bloco central;
c) se fez eleger como líder do PSD porque bateu, dentro do partido, os adeptos do bloco central;
d) tomou, como primeira missão da sua vida de líder político, a destruição do bloco central;
e) destruiu o bloco central;
f) afirmou, por várias formas e modos e métodos, a perversidade do bloco central;
g) etc.,
não deixa de ser interessante ver:
Ou o que os cargos fazem às pessoas, ou que a coerência é uma batata, ou que as conveniências, em certas pessoas, são prevalentes, ou que a sede de protagonismo é inelutável, ou o que é a apetência pelo poder, ou, ou, ou.
Quando terá este pobre país um Presidente que perceba a sua função, mais, que entenda a sua função pode ser muito mais útil se não se meter onde não é chamado? Sabe-se que um Presidente não é um Rei, nem lhe pode chegar aos calcanhares. Mas há, por essa Europa civilizada fora, alguns presidentes que imitam bem, e que conseguem dignificar o seu mister e o seu país.
António Borges de Carvalho