NOTAS DE QUARTA-FEIRA DE CINZAS
Ainda o Golpe de Estado
Um tal Ramos escreve: “tirando Santana, nunca os portugueses removeram, pelo voto, um primeiro-ministro”. Sei que é chover no molhado, mas nunca será demais repetir que quem removeu Santana foi o PR Sampaio, à revelia do espírito do legislador constitucional, interpretando extensiva e ilegitimamente os seus poderes, pondo em causa o regime constitucional, perpetrando, por conseguinte, um golpe de estado constitucional, que é o que se chama a isto em ciência política. Só se poderia dizer que Santana foi apeado por via eleitoral se se lhe tivesse dado um mínimo de tempo (o resto da legislatura) para governar.
Cortes ecológicos
Há meses que anda por aí uma polémica monstra sobre uns sobreiros cortados não sei onde, insinuando-se as maiores tropelias acerca do assunto.
Por outro lado, o governo que temos destaca, da chamada “reserva ecológica” – uma pangaiada de cartógrafos e paisagistas - 744 hectares, a partir de um total de 12.000.
A quem não anda nos meandros destas intrigalhadas ocorre perguntar se um abate de sobreiros, compensado – como se diz que foi - com a plantação de muitos mais, é terrível aleivosia ambiental, para não dizer crime, e aponta para as mais tenebrosas manobras, tráficos de influências, compadrios ilegítimos, etc., o que será, e para que apontará, a subtracção de 744 hectares à pangaiada da reserva ecológica para fins turísticos, imobiliários, etc., matérias habitualmente objecto das maiores suspeitas.
A explicação é simples: parece que os sobreiros foram abatidos no tempo do governo PSD/CDS, o que torna a coisa gravíssima, e os hectares foram desafectados durante o governo do PS, o que transforma o acto num nobre serviço prestado à Pátria.
Melhor que o Gato Fedorento
O recém-convertido socialista José Miguel Júdice já viu compensada a sua nova filiação (perdão, que o homem é independente, mas adora o Costa): é vê-lo a perorar, por certo a troco de umas massas, na SIC Notícias, de há pouco nas mãos de um dos mais indefectíveis do socrélfios, um certo Teixeira.
O homem tem andado furibundo com o colega Marinho. Não grama o fulano, nem pintado. Desbocado, demagogo, incontinente, gordo, não há nada que o judicioso costo-fernandista lhe não chame. Chegou ao ponto de descobrir que o tal Marinho se está a preparar para se candidatar a Presidente da República, em nome da esquerda alegro-helenista e companhia.
Tal comadres desavindas, estes ilustres causídicos dão mais gozo que o Gato Fedorento.
Virtudes
O senhor Sarkozy e a inocente rapariguinha à qual resolveu unir o seu presidencial destino ganharam um processo contra a Ryanair. O cônjuge macho vai receber um euro de indemnização. O cônjuge fêmea receberá 60.000.
Não há dúvida que a virtude compensa.
Atrevimento
Uma senhora encarregada pelo “Expresso” de fazer a crítica literária de uma obra do grandessíssimo escritor Tavares, produziu um texto que o jornal não publicou por achar que a coisa não tinha “qualidade” para tal. Vai daí, a convidada não gostou e acusou o jornal de censura. O jornal, ofendidíssimo, decidiu processar a indivídua por difamação.
O que, nesta coisa, ocorre perguntar, é se o “Expresso” convida alguém para escrever um texto sobre um determinado assunto, não parte do princípio que esse alguém é competente para o fazer. Se é assim, e de outra forma não se entende o convite, por alma de quem se recusa a recepção da encomenda?
O Irritado explica: é que o senhor Tavares goza da imunidade dos semi-deuses. O homem alcandorou-se a tais alturas que se torna proibido dizer mal do que escreve. Aliás, é o próprio quem o diz quando, no fim do livro, preto no branco, declara desafiar seja quem for a pôr em causa o que escreveu. O “Expresso”, atento, venerador e obrigado, dobra a espinha, e “corta” o artigo da fulana.
Censura? A esta pergunta, o Irritado até tem medo de responder.
Bojardas
O Ilustre director da Polícia Judiciária veio, publicamente, pôr em causa as investigações da organização. Dadas as características do caso Maddie, a espantosa intervenção do homem tem consequências devastadoras para a PJ, e gravíssimas para o país.
Pior ainda é que o ministro socrífio da Justiça não perdeu tempo: aproveitou a primeira oportunidade para declarar a sua total confiança no desbocado indivíduo. E ainda pior que isto é que o chefe de todas as investigações deste pobre rectângulo, o senhor PGR, ficou caladinho como um rato.
Benesses e mais benesses
O Irritado tem tido o cuidado de sublinhar as inúmeras benesses que o governo que temos tem feito chover sobre o povo. Por isso, mal ficaria se não desse o devido relevo a mais uma genial medida, consubstanciada na aplicação de uma multa de vinte cinco euros a todos os canalhas que peçam reforma por doença e que não vejam a sua pretensão atendida. Quer dizer, se você tiver uma leucémiazita, ou uma perna a menos, ou andar a vomitar as tripas, e a distinta comissão das reformas, conhecida pelo seu sentido de justiça, achar, e muito bem, que você está apto a carregar caixotes, será penalizado com vinte e cinco euros, a fim de, para a próxima, não se armar em parvo. Justiça é justiça, nas mãos desta gente.
Federalismos
O camarada Jardim, grande líder atlântico, veio propor uma federação entre o rectângulo e as ilhas. Genial. No que ao Irritado diz respeito, a coisa é pouca, o homem não teve a devida coragem. O que ele devia propor, ipirangamente, era a “independência ou morte”. Ele ficava todo contente, e nós deixávamos de lhe pagar fortunas pela estafada história da soberania. Não é?
António Borges de Carvalho