A GRANDE MANIFESTAÇÃO
Domingo passado, à volta da Praça do Campo Pequeno, inusitados ajuntamentos pululavam no jardim. Inúmeros carros da Polícia - dos pacíficos, não dos negros do Corpo de Intervenção –, estacionados no proibido aos indígenas, traziam magotes de agentes, todos bonitos, de coletinho amarelo. Grupos de picniqueiros espraiavam-se na relva e nos bancos da CML, abriam tachos e tuperwares, garrafões e cervejolas, chouriços e rissóis, e consolavam os estômagos. Pensei que seria uma concentração das testemunhas de Jeová, ou da IURD. Perguntei o que era aquilo a um tipo da embaixada de Angola. Mànifèstàção, respondeu. Um grupo de velhas gordas apareceu com uns pauzinhos na mão, com bandeiras vermelhas enroladas. Vi então mais claro. Era o PC com o casaco da CGTP!
A coisa foi evoluindo, o ajuntamento crescia. As bandeiras começaram a desenrolar-se. Montanhas de autocarros despejavam embandeirados fiéis. Gente surgia dos lados da estação da CP. Bem ao meio do magote, altaneiro, um enorme pano encarnado ostentava o focinho do Guevera, a testemunhar o apreço da multidão pelo notável assassino, torturador e torcionário das Américas.
Fui para casa.
Duas horas depois, fui ver o que se passava. O mais interessante era o profissionalismo dos mandantes. Em grupos devidamente organizados, o pessoal começava a desfilar pela Avenida de República, todos bem afastados uns dos outros, dispersos para parecer muitos mais. Uns altifalantes ribombavam antigos slogans, com parca participação dos marchantes. Uns tambores tonitruavam, julga-se que para dar alento à silenciosa turba. Os organizadores separavam os grupos, para alargar o cortejo. Calculo que algures estivesse o camarada Jerónimo com os acólitos do comité central, devidamente salvaguardados por tropas de elite com as habituais faixas protectoras. Menos protegida, julgo, iria a camarada Catarina, rodeada pelas esquerdoidas aias e assessorada pelo careca. No Campo Pequeno, à medida da partida dos pelotões, o movimento começava a rarear. O camarada Arménio,disseram-me, estaria no Rossio, no palanque, a preparar a sua discursata.
Achei que, de qualquer maneira, a mobilização era notável. Grande participação, ainda que não desse para encher o estádio do Belenenses. Admirável. Aterrador, ou nem por isso. A importância do número veio a ser amenizada pelo próprio Arménio, nas palavras de um dos seus capangas. Certamente por defeito, ficámos a saber que foram contratados 150 autocarros e quatro combóios para trazer pessoal do Porto. Imagina-se que outros tantos viessem de outros lados. Uma passeata até Lisboa à conta da CGTP. Grande organização!
Há muitos anos, nos tempos da II República, uma grande manifestação de apoio a Salazar foi convocada pela União Nacional. Com estes que a terra há-de comer ouvi um jornalista da Emissora Nacional a entrevistar uma velhinha que estava a comer um croquete sentada num poial da Rua do Ouro. “Então, a senhora de onde vem?” “De Carrazeda de Ansiães”. Muito bem! E, para o público: “Aqui têm esta senhora que, apesar da sua provecta idade, não quis deixar de vir a Lisboa aclamar o senhor Presidente do Conselho!” Voltando à senhora: E o que veio cá fazer?” Ela: “Vim ver um grande homem”. Ele: “Diga aos nossos ouvintes o nome desse grande homem”. A senhora hesitou, depois disse: “Não sei bem. Parece que é um tal Baltazar”.
Os autocarros da CGTP seriam tantos como os da União Nacional, ou mais, porque agora há mais autocarros que naquele tempo. Mas as velhinhas et alia são mais ou menos as mesmas. Que diabo, um passeio a Lisboa é um passeio a Lisboa!
11.6.18