A PELE DO LOBO
Os tratadistas, os juristas, a liguagem política comummente aceite, atribui ao termo “guerra” um significado que não se confunde com “manutenção de ordem pública por meios violentos” ou com “resposta civil a actos de terrorismo urbano”. Guerra é mais precisamente luta armada, militar, contra um inimigo, seja ele estado agressor ou guerrilheiro armado.
O Presidente e o PM franceses (como há anos o Presidente Bush) declararam guerra ao terror, ou com significado meramente semântico ou como efectiva declaração de guerra contra outro estado. No caso presente não podem alegar a não territorialidade do inimigo, sabido que é onde ele está, e não sendo os ataques a Paris outra coisa que não uma sua, aliás declarada, manifestação extra-territorial.
Quando ouvi Hollande declarar guerra ao Daesch, pensei que o anúncio seguinte, para além da caça policial ao homem em França, seria o do lançamento de ferocíssimos ataques da força aérea francesa ao território do inimigo, com o objectivo de o destruir, de aniquilar as suas fontes de financiamento (poços de petróleo, locais e estradas por onde circula a sua clientela, facilities de comunicação informática e de obtenção de divisas, etc.), de aniquilar a sua administração pública e a sua rede de transportes – que existem e funcionam -, de ferir de morte a sua inegável organização política, civil e militar. Pode discutir-se, com argumentos de peso, se tal seria aconselhável. O que não se pode, ou não devia poder, é declarar “guerra”, não fazer guerra nenhuma, e ficar à espera não se sabe bem de quê.
O caso é super complicado. Basta dizer que considerar que a França foi atacada por um inimigo externo bem identificado é o suficiente para obrigar ao desencadeamento de uma reacção armada dos países da NATO, em conformidade com a célebre e nunca usada disposição do Tratado do Atlântico que obriga à reacção de todos quando um for atacado. Tal teria imprevisíveis consequências, eventualmente catastróficas.
Será esse o objectivo das declarações oficiais dos franceses? Não sei. O que sei é que quem não quiser ser lobo que não lhe vista a pele.
15.11.15
Adenda: já este texto estava publicado, soube-se que a aviação francesa tinha bombardeado posições do Daesch. Parte do escrito fica prejudicada. Mas, com este eclarecimento, não vejo razão maior para o alterar.