COMPADRES
Não faltam por aí opiniões sobre a história da queda dos ES. O IRRITADO não arrisca tal coisa, porque, como a generalidade das pessoas, comentadores encartados incluídos, não percebe patavina do assunto e se dá por muito feliz por – pela simples razão de não ter dinheiro – não estar “exposto” aos efeitos da derrocada.
Ricardo Salgado é universalmente tido como principal responsável, o que é natural, já que era ele o chefe máximo da organização. Não falta quem já o tenha condenado a prisão perpétua ou equivalente.
Interessante, por isso, é olhar os originais que o defendem.
O primeiro foi o senhor Pinto de Sousa, tido por eng.º Sócrates. É natural, já que é de temer que o Salgado, acossado, ponha a boca no trombone, o que pode ser uma chatice. Nada melhor que tirar o cavalinho da chuva.
O segundo é muito mais interessante: nada menos que o inevitável e importantíssimo – na sua opinião – Sousa Tavares, conhecido storyteller e convencidíssimo dono de inúmeras irrefutáveis teorias e razões.
Desta vez, a teoria do homem é extraordinária: Ricardo Salgado é, simplesmente, vítima de uma família de penduras e preguiçosos a cuja ganância se viu obrigado a acorrer, expondo-se à verrina pública por amor aos seus.
Na base desta tão douta opinião estão considerações várias sobre o capitalismo, que vão do problema da Argentina a Karl Marx, tudo para dizer que o capital se divorciou da economia e, querendo ganhar dinheiro com dinheiro, acabou por viver em circuito fechado e criar as condições para a sua própria, e a dos outros, condenação. O IRRITADO, postas as coisas nestes termos, até nem discorda lá muito. O problema é que, na sanha de defender o Salgado, o ilustre sábio pôs as coisas de pernas para o ar. É que, segundo se diz por aí, os problemas do homem começaram e se avolumaram, não porque ele vivesse na finança pela finança, mas por causa das suas incursões económicas em empreendimentos arriscados. O argumento cai pela base, como é evidente.
Mais interessante, porém, é saber por que carga de água resolveu o nosso Tavares vir à liça com tão contraditórias bojardas. Aqui há tempos, já não sei a que propósito, o fulano tinha feito uma “declaração de interesses”: abstinha-se de comentar qualquer coisa relacionada como BES, ou ES, porque, tendo uma filha casada com um filho – ou vice versa - de Ricardo Salgado, qualquer opinião podia estar “contaminada” ou ser tida por influência familiar. Fez muito bem. Só que parece que era tudo mentira, isto é, não se pronunciava porque não lhe apetecia, não porque os seus interesses de tal o impedissem. Como o caso presente demonstra à saciedade. Quer dizer, chegada a ocasião, que se lixe a “declaração de interesses”, e vai de proteger o compadre.
O mentiroso e o coxo são amigos! O resto é conversa de articulista para papalvo ler.
3.8.14
António Borges de Carvalho