DA GERINGONCIAL IMPRENSA
A entrevista de Passos Coelho à SIC foi brindada com ecos vários na imprensa “de referência”. No dia seguinte, Dias Loureiro, o futebol e outras “importantes” matérias vieram para as primeiras páginas, Passos Coelho para página par interior, tipo fait divers. Do que disse, ficou nas notícias praticamente só que não se iria embora se perdesse as autárquicas. Não iria para Paris como o seu miserável antecessor, não iria para a peluda como o Guterres, não diria que tinha ganho tendo perdido como o Costa, não diria que a derrota tinha sido pequenina como este tinha dito das vitórias do Seguro. Por outras palavras, para ele, as eleições, as autárquicas como as legislativas, têm o valor que têm, não o que lhes atribui a cultura socialista. Nesta, quiçá por mor da moral republicana, quem ganha deve ser corrido, como o Seguro, quem perde deve ser primeiro-ministro, como o Costa. Uma diferença notável, no que respeita àquilo a que se poderá chamar ética política e respeito pela vontade popular.
Adiante. A entrevista, excitou a cáfila da oposição interna, mais do que a oposição à oposição. Que não há projecto, que não há propostas, que não há novidades. Os rios e riachos, os mendes e os pereiras que por aí apascentam objectivos e ilusões saltaram-lhe às canelas. Quereriam que Passos desatasse a falar de projectos e propostas que dariam aos geringonços oportunidade para insultos e acusações. Se vertidos em projectos de lei, quais fossem eles, seriam exemplarmente chumbados. Para quê adiantar fosse o que fosse? Toda a gente sabe, mesmo que não goste, que a seriedade e o bom senso são as armas de Passos Coelho, como a “leveza” e a propaganda são as da geringonça.
Para já, Passos Coelho sabe que não vale a pena. Há que esperar, há que ter calma e tenacidade. Há que denunciar o mar de asneiras e de populismo em que estamos mergulhados, que chamar a atenção para as suas inevitáveis consequências, que marcar as diferenças entre o que tem futuro e o aventureirismo popularucho em vigor. Isso fez Passos Coelho com a serenidade que lhe é habitual. Sabe que tem que esperar, sem fazer demagogia, propalar promessas ou agitar ideias sem futuro imediato.
Mas isso não interessa, nem à imprensa nem aos jornalistas da TV que, à custa do homem, se exibiram como de costume. Estavam ali para se “valorizar”, não para deixar que as opiniões do entrevistado se manifestassem. Gostava que alguém fizesse a estatística das respostas que deixaram chegar ao fim sem impertinente interrupção, das mudanças constantes de tema, sempre com critérios meramente sensacionalistas, a tentar arrastar o entrevistado para parangonas que alimentassem intrigalhadas. Passos Coelho, na medida do possível, não lhes deu cavalaria. Fez bem, mas condenou-se às páginas interiores. A imprensa não brinca com quem não faz manchetes.
Passos Coelho não terá “estratégias” para voltar ao poder. Não entra em palavreado para inglês ver ou eleitor engolir. Vai afirmando um estilo e, direi eu, terá esperança que, vistos os resultados de longo prazo da geringoncial trapalhada, a serena vilolência da razão venha ao de cima.
10.4.17