DA LIBERDADE ECONÓMICA
Nos idos tempos da II República, era o Salazar que decidia quem comprava o quê, quem vendia o quê, quem era bom e quem era mau. Havia o célebre condicionamento industrial, só investia quem o Salazar dissesse, ficando de fora quem o Salazar mandasse ficar de fora. Liberdade económica, só a que, no seu esclarecido espírito, funcionasse a bem da Nação, sendo a bem da Nação o que ele achasse que era a bem da Nação.
E pronto, era um sistema, isto é, a liberdade económica era uma batata.
Nos gloriosos dias da III República a liberdade económica faz parte da filosofia da dita, é um must, é a regra, não há Salazar, nem condicionamento, só liberdade. Mas como a liberdade, se deixada a si própria, é suposta dar chatice, ou ser uma chatice, houve que substituir o Salazar por umas coisas que dão pelo nome de “entidades”, “reguladores”, “comissões”, “autoridades”, “altos comissariados”, “agências”, enumeração esta que nada tem de exaustivo. O Salazar anda aí, mascarado, caríssimo e poderosíssimo.
Vem isto a propósito de uma série de desgraças que por aí campeiam.
Para mim, a pior de todas é a mudança de comportamento da organização do senhor Belmiro, coisa que era conhecida como das poucas que não andavam penduradas no Estado. O filho do senhor Belmiro, como o IRRITADO tem referido, mudou de postura. Considerando-se ameaçado pela concorrência, desatou aos gritos que lhe estavam a mexer no bolso e que as “entidades”, “reguladores”, “comissões”, “autoridades”, “altos comissariados”, “agências”, etc. têm a mais básica missão de agir em função dos seus interesses. E as “entidades”, “reguladores”, “comissões”, “autoridades”, “altos comissariados”, “agências”, etc., acham que sim, que têm que se pronunciar, autorizando, condicionando ou proibindo.
Uns tipos franceses querem comprar uma empresa portuguesa a uns tipos espanhóis. Os tipos espanhóis estão meio falidos, querem vender, e aceitaram o preço oferecido pelos franceses. Tudo bem. Não. Tudo mal. Esqueceram-se da versão actualizada do condicionamento. Não se percebe: o senhor Paulo, se não quer que os franceses comprem, em boa liberdade económica só tinha um remédio: oferecer melhor preço e melhores condições. Se não tem dinheiro ou não o quer gastar, então a solução seria meter a viola no saco. E parece que o Estado se acha no direito de proteger os interesses do senhor Paulo, arrogando-se o direito de “condicionar”.
Na sua ignorada tumba, o Salazar deve estar a rir a bandeiras despregadas.
12.11.17