ESQUERDA CULTURAL
É tão alta a consideração que Marcelo Caetano merece enquanto professor (ainda hoje não há, pelo menos na sua especialidade, quem lhe chegue aos calcanhares), como baixa acabou por ser a sua prestação como político.
Com outro administrativista de grande fôlego, Lopez Rodo, seu discípulo e admirador, trocou correspondência intelectual e jurídica que merece estudo. Tal correspondência foi há pouco publicada em livro. Como é natural, a obra teve o seu lançamento na Faculdade de Direito de Lisboa, no mesmo edifício onde, durante tantos anos, comunicou aos alunos o seu alto saber.
Até aqui, tudo normal. A Faculdade, como edifício, é hoje a mesma do seu tempo. Pensariam os menos avisados que o tal lançamento seria feito num dos magníficos anfiteatros que por lá há. Pensavam mal. A sessão teve lugar numa obscura cave, munida de cadeiras manhosas, onde se apinharam umas dezenas de pessoas. Quem lá fosse assistir não a encontrava e, se perguntasse aos alunos ou aos contínuos, verificava que ninguém estava a par do assunto, sendo indispensável percorrer corredores e corredores mais ou menos subterrâneos até chegar ao local. É de pensar que muita gente tenha desistido.
A coisa era para esconder, aliás como confessou o seu apresentador, Marcelo Rebelo de Sousa. Segundo a nova direcção da Faculdade, caracterizada pelas suas tendências esquerdistas, o assunto não era compaginável com as comemorações do 25A, por conseguinte acederia generosamente a autorizar a sessão, mas só nas circunstâncias absolutamente indignas em que acabou por se realizar.
A esquerda muito preza a cultura, desde que a cultura seja “cultura”, isto é, seja de esquerda. E é capaz de tudo o que for preciso, incluindo pisá-la, falsificar a História, desrespeitar pensadores, meter no caixote do lixo o que não lhe convém, calar quem se atreva a pensar de outra maneira que não a dela. A ditadura tinha a “desculpa” de ser ditadura. A esquerda, dita democrática, não tem nenhuma desculpa, mas não se exime de praticar as mais rebuscadas formas de censura e de ostracisar os “descrentes”.
A esquerda manda na Faculdade de direito. Está tudo torto.
5.5.14
António Borges de Carvalho
ET. Imaginem que a sessão era acerca da obra artística do Álvaro Cunhal: anfiteatro número 1, tímbales e charamelas, não é?