GENTE FINA
Fomos hoje brindados com uma interminável entrevista que o “Observador”, sabe-se lá porquê, publicou, sendo o entrevistado o abominável Pedro Nuno Santos, empreiteiro, mestre de obras e encarregado da manutenção da geringonça.
Há relativamente pouco tempo, este artista, como diria Cavaco, zurzia a Merkel, o Schäuble, a UE, Bruxelas, o Jeroen, o BCE, a troica e o governo legítimo com inacreditáveis diatribes. A dívida é para não pagar, um bando de proto-fascistas apoderou-se da União Europeia, é o capitalismo de casino, o défice e os tratados que se lixem, o governo está apostado em empobrecer o povo, Passos Coelho é o carrasco da Nação, e por aí fora, a fazer inveja ao PC e apaniguados. É preciso lembrar que militou na Frente Eleitoral Comunista (Marxista- Leninista), FEC (ML). Deve ter aderido ao PS para preparar os “amanhãs que cantam” isto é, para destruir a democracia por dentro. Citemo-lo: Estou a marimbar-me que nos chamem irresponsáveis. Temos uma bomba atómica que podemos usar na cara dos alemães e franceses. Essa bomba atómica é simplesmente não pagarmos(...) as pernas dos banqueiros alemães até tremem...
A seguir a Passos Coelho ganhar de novo as leições, foi o resultado delas, como é do conhecimento geral, posto no lixo e, do caixote, saíu a geringonça. Daí, deu-se a maravilhosa transmutação do cérebro do contemplado, um autêntico milagre, coisa que fará os mal intencionados como o IRRITADO dizer que virou a casaca.
Hoje, dando razão aos que o acusam de falta de espinha (ou de esperteza marxista-leninista em versão Porsche), diz exactamente o contrário. Passos Coelho merecia a fogueira por, alegadamente, querer “ir além da troica”. Agora, o artista, com alta competência circense, declara que, se a Europa quer 0,5% de défice, dar-lhe-emos 0,2! Não quer ir além da troica, mas vai além de Bruxelas, o que é mais ou menos a mesma coisa. O que é pecado vindo da “direita”, passa a virtude quando é defendido pela esquerda. O rapaz tece rasgadas loas ao nosso “crescimento” (o qual é miserável e nada tem a ver com a geringonça), acha que a coisa criou postos de trabalho (aparecidos apesar da geringonça, e vastamente mal pagos), garante que o estado comatoso da saúde, apesar do dinheiro que a geringonça lá pôs (diz ele) não tem nada a ver com as maravilhosas 35 horas. Pois não, que ideia! No ministério da saúde “não há cativações”. Quem as faz “é a direcção geral”. Percebem? Deve ser por isso, defende, que “ninguém, à esquerda, diz que o SNS está pior”. Depreende-se que quem dá pela catástrofe é gente da direita, quem sabe se fascistas, homofóbicos, ou, na melhor das hipóteses, tenebrosos liberais. A perda de produtividade, a ausência de poupança, os calamitosos resultados da educação e coisas do género não merecem uma palavra do fulano.
Fala de si. Diz-nos: “vendi o Porsche”, e declara: “admito que foi um erro”. Não ficamos a saber se o erro foi comprar ou vender a bela máquina. Verdade é que o homem não tem problemas de mobilidade: garantem as mais ordinárias vozes que, lá em casa, há uns Maseratis ou equivalente, à boa maneira do Norte. Ele até tem um império familiar (um “grupo”) onde trabalhou antes de ir para a política, sendo que tal experiência acresce à “componente política” da sua personalidade, o que é “relevante para qualquer função ministerial”. Ça va sans dire: isto é uma dentada de morte no Costa, que não goza da “componente” empresarial. Mas, é claro, o PM goza da sua mais fiel fidelidade!
Para não maçar mais quem me lê, sublinhe-se ainda os rasgadíssimos elogios com que o artista contempla o chairman da geringonça, residente em Belém. Vivemos num mar de traições. O PNS parece (ou só parece) ter traído a revolução marxista-leninista, prepara-se para trair o seu CEO, e elogia com ditirambos um outro, que traiu quem o elegeu.
Tudo gente fina.
25.10.18