“HISTÓRIA”
Há para aí trinta anos, fui pela primeira vez a São Tomé. Para além do que tinha a fazer por lá, a curiosidade foi muita.
O país vivia sob um regime tipo “democracia” popular, mas havia já uma ténue tendência para uma viragem, pensava-se numa nova constituição, propunha-se acabar com a influência cubana e com as “tropas de ocupação” que Angola por lá mantinha.
Um dia, foi-me dado ler um manual escolar de história, de origem cubana, onde se lia que a humanidade tinha vivido nas mais profundas trevas até à gloriosa revolução de Outubro, momento em que o “sol”, criado por Marx e Engels e posto em prática por Lenine e Estaline, tinha passado a iluminar marcha dos povos de todo o mundo para o progresso e a felicidade. A idade da pedra tinha acabado em 1917, altura em que tinha início a verdadeira história do género humano.
Não se riam. Não tem graça nenhuma. Era esta a postura cultural que a influência soviética proporcionava às gentes.
Não se riam. Por cá, mutatis mutandis, passou-se e continua a passar-se mais ou menos o mesmo.
Vejam, por exemplo, o artigo 1º da nossa tão incensada Constituição: “Portugal é uma República…”. Não é uma Nação, é uma República. Como as definições, literalmente, limitam, aí temos, limpinho, o conceito cubano: se Portugal se define como República, o que havia antes dela podia ser tudo menos Portugal. Esta beleza conceptual está há 40 anos em vigor e ainda não houve uma só alma que propusesse corrigi-la.
No seguimento deste tipo de “pensamento”, desta feita em versão ultra jacobina, um fulano que até foi ministro não sei de quê, deu à estampa um livrinho chamado “Heróis do Mar – História dos Símbolos Nacionais”. Escusado será acrescentar que, honrando a tradição cultural de que venho falando, tais símbolos são, exclusivamente, os da República, isto é, antes da República, nada havia, nem símbolos. Pelo que, por muito “culto” que seja o autor, ao chamar ao escrito “História dos Símbolos Nacionais”, ou está a aldrabar os leitores ou merecia ter sido ministro da educação de São Tomé em 1980.
A criatura “descobriu”(!) que tais símbolos só foram consagrados na consciência popular quando, por causa da bola, o Filipão deu ordens para pormos a bandeira à janela, o que é uma incoerência com a sua “tese”, mas… paciência. Não quer é “descobrir” que, num país que, durante oito séculos, teve como cores nacionais o azul e o branco, não é, ou não foi, fácil mudar coisas tão geneticamente adquiridas.
A não ser que a bandeira a que o senhor Nuno Severiano Teixeira chama nacional seja, de acordo com o artigo 1º da Constituição, assumida como bandeira da República, e de nada mais. É o que eu faço.
PS. É tal o “respeito” do homem pelos “símbolos nacionais” que veio dizer nos jornais que os membros do governo, ao usar a bandeira na lapela, a estão a “privatizar”, a apoderar-se dela, e outras bojardas do género. Por outras palavras, isso de usar na lapela a bandeira da República devia, na opinião deste pacotilheiro, ser reservado aos membros do PS ou a quem tivesse um certificado de fidelidade ao jacobinismo passado pelo Dr. Almeida Santos.
10.6.15