NÃO É COM VINAGRE...
A rapaziada grega levou uma tunda das antigas. Não se diga que foi a Alemanha que a pôs nos varais. Foi a Europa inteira, a Europa com euro e a Europa sem euro.
Por cá, ficou o socialismo nacional “moderado”, representado pelo Costa-cata-ventos-e-marés, a titubear inanidades; o socialismo radical, esse, manteve gloriosamente os mesmos “paradigmas”, esperneando como de costume, sempre com o fiel apoio dos pornográficos trombones da “informação”, tanto pública como privada.
Os heróis gregos não queriam a troica, levaram com a troica nas fuças. Não queriam austeridade, comeram-na sem batatas. Não queriam falar com funcionários, vão vê-los desembarcar em Atenas não tarda nada. E vão levar com muito mais, ou seja, com a triste desgraça em que se afundaram e com os únicos “remédios” existentes na farmácia da política. A fantasia dos extremismos falhou.
Nada do sucedido tem a ver com “crueldade”, “dignidade”, “soberania nacional”, “abusos dos mercados e dos bancos”, “tirania germânica, “egoismo nórdico”, embora tenha a ver com isso tudo. Explico: essas coisas existirão mas nada se fará por via revolucionária ou por incumpríveis promessas maximalistas, como as da troica grega, isto é, do Tripas, do Faquis e da extrema direita, unidos por miríficos objectivos e por desbragado populismo.
Entre outras, por duas razões.
A primeira é que a perda de soberania nacional é um facto insofismável. O que resta a quem quiser reavê-la será sair da União. Mesmo o conceito de “soberania partilhada” não serve para resolver a questão. Ou foi transferida ou não foi. Pode contestar-se, com razão, que o sistema carece de boas condições de funcionamento, que a burocracia e a lógica financeira ultrapassaram a política, que há défice de legitimidade... Mas o que há, há, e é o que há. Os Estados-Nação já não têm, por exclusiva vontade própria, outra forma de resolver certas questões que não seja contratualizá-las com todos os outros, sendo estulto pensar que os governos nacionais fazem o que lhes der na cabeça ou, na liguagem do novo nacionalismo – tão perigoso como o velho –, exercem o poder da forma que os eleitorados decidiram, sejam quais forem as medidas que escolheram ou que foram internamente vendidas ao eleitorado pelos políticos de serviço. Quem percebe isto, que se deixe ficar. Quem não percebe, quem não aceita, que se vá embora.
O Syriza jogou com o medo: os parceiros não podiam suportar a ideia da hecatombe que a sua saída – do euro ou da União – provocaria. Por isso, oa outros comeriam a papa que os gregos lhes dessem. Mas as coisas mudaram e a ameaça não encontrou eco, isto é, os outros perceberam que não haveria hecatombe nenhuma, só mais uma grande chatice.
A segunda tem a ver com a negregada austeridade. A austeridade é um inelutável must, na Grécia, na Alemanha ou seja onde for. Quando as economias deixam de dar para a despesa, nos países como cá em casa, há que ser austero. Não há volta a dar. A economia, na Grécia, na Alemanha e cá em casa, está pelas ruas da amargura. As soluções financeiras são precisas mas não são tudo. As economias tradicionais não funcionam porque se deixaram ultrapassar por terceiros, o emprego desce porque a tecnologia o substituiu, as despesas aumentam com a esperança de vida, os empresários não arriscam porque, ou não têm confiança ou lhes não ocorrem ideias novas. Quando, há anos, a crise começou, ouvia dizer-se “é preciso mudar de vida”. Toda a gente estava de acordo, sobretudo se quem mudasse de vida fossem os outros. Quando toca a cada um, 'tá quieto!
Sem dúvida que se pode repensar tudo o que se tem feito, que se pode melhorar o funcionamento das coisas, que se pode evoluir no sentido de as tornar mais suportáveis, mais legítimas, mais aceitáveis, mais produtivas, mais sérias. Ninguém duvida. Mas que ninguém duvide, igualmente, que as soluções radicais ou revolucionárias só as tornarão muito piores do que já são, na Grécia, na Alemanha e cá em casa.
O Syriza bateu na rocha, e vai continuar a bater. O mesmo sucederá ao Podemos, se tivermos a desgraça de o ter pela frente. O mar não se acalma com azeite. Ainda menos com vinagre.
22.2.15
António Borges de Carvalho