O IMPÉRIO ORIENTAL
A evolução das coisas na Turquia é, de longe, uma ameaça maior que todos os fundamentalismos juntos. É que, se Mustafá Kemal fez os mais revolucionários esforços para ocidentalizar a Turquia, Erdogan está decidido, custe o que custar e a quem custar, a remuçulmanizá-la, e da pior maneira.
Longe vão os dias em que, na praça Taksim, protestavam os que temiam o iminente caminho para a ditadura teocrática, o poder pessoal, o fim do Direito no Estado e dos direitos dos turcos. Hoje, nem a uma só voz é permitido pôr em dúvida tal caminho. As listas da purga estavam elaboradas, como é evidente, à espera de uma oportunidade. Nenhuma liberdade escapa, nenhuma opinião desalinhada se tolera e – maior perversidade é impossível - em nome de uma democracia, representada por massas ululantes, estabelece-se ou reestabelece-se o poder totalitário, sem peias nem escrúpulos.
O “tampão” turco da Europa e do mundo Ocidental deixará simplesmente de existir, e ninguém sabe como nem quando outra estrutura fiável poderá ser posta em acto.
São já evidentes as intenções do ditador de recriar a “grande Turquia”, com incontidas ambições hegemónicas no médio oriente, no Cáucaso, na Ásia central e, porque não, uma vez tal hegemonia consolidada, o avanço para Ocidente, coisa que jamais deixou de estar no imaginário colectivo dos saudosistas imperiais.
Talvez nada disto venha a acontecer. Resta saber à custa de quê. Desta feita, a ameaça não é a de grupos terroristas mais ou menos organizados, nem a de loucos e camicases, é a de um poder imenso, militar e económico, disposto a tudo em nome de um regime que se diz democrático ao mesmo tempo que mete todos os valores da democracia no caixote do lixo. O poder turco vai deixar de ser alinhado com o Ocidente para ir buscar apoios à Rússia de Putin e a outros dignos de igual “confiança”, na mira de uma nova divisão de influências e de equilíbrios. Mudam os pratos da balança, aumentam os riscos, agora não de fora mas do próprio seio das nossas defesas.
13.8.16