PORCARIA
De que serve ocultar nos orçamentos certas despesas para fazer diminuir o défice, e acobertar debaixo de uma prosperidade fictícia o verdadeiro estado das coisas públicas?
As situações difíceis não se remedeiam, os obstáculos não se removem, as resistências não se aniquilam, os cataclismos sociais não se evitam senão com uma política franca, verdadeira e desassombrada.
Eça de Queiroz, 24.1.1867
Pode parecer que o grande Eça estava a criticar o seu tempo. O que estava, porém, era a fazer futurologia. As ocultações e a prosperidade fictícia cá estão. Os cataclismos também. A política franca, verdadeira e desassombrada morreu quando a geringonça e o seu guarda-livros, um tal Centeno, subiram ao poder. À qualidade dos políticos do séc. XIX acresce agora falta de educação, pesporrência, desprezo pelos que têm a ousadia de ter opinião diferente: todos os partidos, todos os reguladores, todos os estudiosos, não passam, na palavra desonrada do governo e do seu guarda-livros, de ignorantes crassos, de iletrados, de perseguidores, enfim, de um bando de canalhas apostados em denegrir a sua imperial excelência.
Os tempos são outros mas a porcaria é a mesma, ou pior.
4.11.18