PRESIDENCIALICES
Estamos a entrar na fase mais inútil e contraproducente das jornadas eleitorais a que temos sido submetidos. E aí vamos, ou não vamos (temos essa liberdade) votar num senhor - entre inúmeros outros (quantos são, quantos são?) – que, por sua alta recreação, resolveu que queria ser Presidente da República. Ou chefe do Estado, como lhe chamam. Um senhor que representa a República, e mais nada senão a República, embora, uma vez empossado, venha dizer aos quatro ventos que representa o País, a Pátria, os Portugueses, a Nação, a História, a Cultura, a Tradição, e mais o que lhe vier à cabeça. Nalgumas coisas, a nossa bem-amada Constituição há-de estar certa: o Presidente da República representa a República, e mais coisa nenhuma.
Não sei se haverá à nossa volta algum país em que o Presidente seja eleito por sufrágio universal para ser titular de (quase) nenhum poder. É claro que a nacional bem-pensância lhe inventa uma série de “funções”: a “magistratura de influência”, o poder do bom (?) conselho, o comando supremo das forças armadas – muito útil em paradas militares e coisas do género – e outros títulos de glória. Poder político só tem um: o de dissolver o parlamento quando lhe der na cabeça. Tem-se visto o resultado.
Aqui na nossa vizinhança, o único Presidente eleito por sufrágio universal é o de França, regime semi-presidencial, ou seja, o Presidente é o titular máximo do poder político com limites parlamentares, responsável por um governo de sua escolha. O nosso regime diz-se semi-presidencial, mas de presidencial nada tem. Ou seja, somos levados a votar para nada, ou pior, a pôr no topo da República uma pessoa a quem não conferimos poder político. Em países mais sensatos, o Presidente é escolhido pelo parlamento para funções protocolares de representação do Estado, ou da República, se quiserem. Geralmente, uma pessoa universalmente prestigiada a quem se confere funções de representação que estão para além do poder político propriamante dito: caso da Alemanha ou da Itália, por exemplo.
De resto, nas melhores democracias da Europa foi mantido o regime monárquico, em que o mais alto representante do país é escolhido por sucessão com investidura parlamentar. Daí, o Rei, para além de se ocupar das funções protocolares do cargo, poder legitimamente e em total independência representar as mesmas coisas ou valores a que os nossos tristes presidentes costumam arrogar-se sem legitimidade para tal.
Não sei se haverá algum país com uma sistema como o nosso. Se há, coitado dele.
17.10.25