QUEM, EU?
Foi com inenarrável e espantado gozo que vi, ontem, um senhor magrinho, com ar inocente, dito secretário de Estado, a perorar o que lhe veio à cabeça acerca do atentado à liberdade, à Justiça, à democracia, ao respeito pelo cidadão, cometido pelas finanças em colaboração com a GNR, a fim de sacar aos incautos uns tostões (mais uns automóveis e uns camiões).
Assim:
O militar bate a pala.
- Bom dia senhor condutor. Faça o favor de me mostrar os seus documentos.
- Com certeza, senhor guarda.
O senhor condutor dá a papelada ao senhor guarda. Após consulta pormenorizada, o homem não lhe devolve os papéis. Atrás dele, um representante do sátrapa das finanças, afia um computador. Pega nos papéis e, uns clics depois, declara:
- Este cidadão deve 243,12 euros às finanças.
E, para o cidadão:
- Quer pagar em dinheiro, pelo Multibanco, por paypal, por MBWay ou por cartão de crédito?
Atónito, o senhor condutor, responde: nem tenho dinheiro para pagar nem quero pagar, .
O senhor guarda entra de novo em acção e, animado por um sorriso malévolo e triunfante do enviado do déspota, diz :
- Muito bem, senhor Manuel, vamos então levantar um auto de apreensão do seu veículo.
- Quê? Está a gozar comigo?
- É a lei, senhor Manel, é a lei.
Preenche um formulário no computador, mostra-o ao flibusteiro das finanças a ver se está nos conformes. Tudo em ordem. Entrega uma cópia ao senhor Manel:
- Prontinho, sor Manel. Pode ir embora, mas a pé. O carrinho fica aqui até que o assunto se resolva.
E lá vai o Manel, à pata, rabinho entre as pernas, que isto de GNR não é para brincadeiras (amor ao físico ou falta de coragem corporal).
A prática de dezenas de crimes deste tipo, como é evidente, deu lugar a inúmeros clamores nos chamados media, que ainda não tinham percebido do que a casa (as finanças) gasta. Assustado, o senhor magrinho veio a correr dizer de sua “justiça”: que o governo, sim senhor, pois, a prática podia ser discutível, mas o governo não tem nada a ver com o assunto. Dei comigo a pensar que as finanças e a GNR não estão sob a alçada do governo, devem ser de algum privado, um bandido como todos os privados. Mas não era assim. Segundo o magrinho, aquilo não passava de uma coisa espontânea, uma iniciativa do sargento da guarda e do chefe da repartição de finanças lá do sítio. Assim, sem mais nem menos, tirou o burro da chuva. Mas não disse que a “operação” tinha sido ilegítima, ou coisa que o valha. Na filosofia do homem, aprendida nalguma madrassa do Terreiro do Paço, a legitimidade não estava em causa.
Num país com cabeça tronco e membros, o magrinho, o chefe do magrinho e o chefe do chefe do magrinho teriam ido à vida. Mas isto, meus amigos, é um país socialista. Ficam todos no poleiro e, se os acusarem, dirão como sempre: quem, eu?
Como se alguém acreditasse que a ordem de batalha não viesse de cima!
30.5.19