QUESTÕES DE ENGENHARIA FINANCEIRA
Confirmando as suspeitas existentes por aí, veio o sr. Pinto de Sousa, dito engenheiro Sócrates, tornar público, via bons ofícios da TVI, que, sim senhor, o Santos Silva, ao que parece engenheiro como ele, o vinha, há anos, sustentando. Ficou tudo cristalinamente esclarecido.
Corrido do poder por via eleitoral, o impoluto cidadão não quis ficar no Parlamento, preferindo o desemprego não registado. Os seus objectivos de vida não se coadunavam com o magro salário de um deputado. Nada mais natural. Trabalhar faz calos, mesmo na distinta Assembleia onde, se quisesse, tinha assento. Além disso, sentia-se impelido a enriquecer os seus conhecimentos filosóficos e queria, legitimamente, conhecer o excitante mundo de uma grande capital europeia. Escolheu Paris, escolheu o 16eme, e escolheu muito bem. Tudo coisa do seu nível socio-político-cultural. Infelizmente, não do seu nível económico, que não compotava a realização do sonho. Não era possível ter um Mercedes-Benz (ao que se diz, dos melhores) com motorista, para deslocçãos em Lisboa e idas a Badajoz, nem, é de pensar, outro carrinho no 16eme, uma secretária, filhos a estudar, as propinas da filosofia, uma vida decente, coisa condizente com o seus altos standing, relações e importância. Não era possível vir todas as semanas a Lisboa educar o povo através da televisão pública, cujo ordenado disse ter recusado. Não era possível sustentar o condomínio do Marquês, nem almoçar no Aviz, ainda menos na Tour d’Argent e similares.
Daí que, como é natural, normal e legítimo, tenha recorrido a um velho amigo. Este era possuidor de uns vinte milhões escondidos algures, milhões que tinha repatriado sem cair nas garras do fisco, que o nosso homem tinha transformado em acolhedores braços sem pedir nada em troca. Os milhões foram-lhe postos à disposição,e ele, para nosso descanso e esclarecimento, desde já declarou que, um dia, os pagará, não se sabe se com juros ou sem eles. Trata-se, como muito bem disse, de assunto privado, coisa de amigos com quem ninguém tem nada a ver.
Para pôr as coisas em pratos limpos, Pinto de Sousa esclarece ainda que, quando a mãezinha quis vender uns andares, a pôs em contacto com o amigo, que se disponibilizou a comprá-los. Feito o negócio a generosa senhora deu ao filhinho o que, por sua morte, lhe caberia em herança. Nada mais claro, nem mais legítimo.
Finalmente, ao que parece para amedrontar os investigadores, o “entrevistado” desanca-os por não fazerem outra coisa que não seja aplicar as leis que ele próprio inventou e subscreveu. Está certo. Ao legislar, ter-se- á esquecido de salvaguardar a sua pessoa, achando, com toda a razão, que, ça va sans dire, as suas leis eram para aplicar aos outros, não a um ex-PM, como aliás tem dito e repetido esse grande luminar do Estado de direito que se chama Mário Soares.
E agora? Agora já toda a gente percebeu tudo. Poderá segundo a “fé” de cada um, dar-se-lhe sentidos diversos. Mas, quanto à matéria de facto, não restam dúvidas: está tudo confessado e assinado pelo interessado.
Podem os juízes não conseguir provar os crimes que investigam. O homem comum, esse, só não sabe o que se passou se for completamente estúpido.
4.1.15
António Borges de Carvalho