SACOS PARA O POVO!
Quando eu era pequeno, havia lá em casa uns sacos dedicados a guardar o pão. Eram de algodão, ou coisa do género, aos quadradinhos ou às riscas. Todas as manhãs, o padeiro batia à janela da cozinha, que era no rés do chão, e a cozinheira recebia os papo-secos e o pão escuro acabadinhos ou quase de sair do forno. No dia seguinte, o pão que sobrava da véspera era servido em torradas ou guardado numa gaveta para uma eventual açorda.
Hoje já não há padeiros a bater à porta, pouca gente haverá que se levante mais cedo para ir comprar pão fresco. Não faz mal, porque o pão da véspera, guardado num saco de plástico bem atado e com um mínimo de ar, se conserva comível dois ou três dias. E compra-se pão fresco, se se quiser, a qualquer hora do dia, sem ser preciso madrugar. A açorda leva mais tempo a chegar, as torradas são precisas a partir do segundo dia, o pão é mais aproveitado.
A tradição do pão fresco, à antiga, mantém-se em França, país submetido ao tenebroso hábito da “baguete”, coisa que, ou se come fresca ou, passada meia dúzia de horas, não presta para nada. As pessoas – uma respeitável tradição – vão à padaria todas as manhãs, e todas as tardes quando saem do trabalho. Que lhes faça bom proveito.
Por cá, e pela generalidade das gentes, foi descoberto o saco de plástico.
Mas o saco de plástico passou a ser considerado pelo terrorismo eco-estúpido em que estamos enclausurados como coisa tremenda, terrível, odiosa, repugnante. Mesmo quando é tão útil como no caso do pão.
Vem isto a propósito da última glória nacional, a “Saca do pão da avó”. Esta notável “invenção” de um tal Carlos Fonseca, foi a única ideia cá do sítio a ganhar um prémio numa chamada “Semana Europeia da Prevenção dos Resíduos”. Para além de demonstrar os prodígios de que é capaz a lusitana capacidade inventiva, este prémio mostra onde pode chegar a palermice pseudo-ecológica dominante. Grande adepto desta “solução” é o dono da padaria de Oliveira de Azeméis que, agradecido ao Carlos, passou a vender-lhe pão todos os dias em vez de um dia sim dois dias não e, certamente por isso, lhe faz um descontinho nas compras que, gostosamente, coloca no saquinho de pano bordado pela tia Eugénia. É bom para o negócio dos padeiros. Eles agradecem, o júri da tal Semana Europeia fica muito contente, Portugal demonstra que, afinal, é um grande país. Hossana!
O IRRITADO não é contra a diminuição do consumo de sacos de plástico, mesmo que a maior parte deles seja, nos nossos dias, reciclada. Pelo contrário. Mas chegar ao ponto de recusá-los, mesmo quando são a melhor maneira de conservar um alimento como o pão, outra coisa não mostra senão o fundamentalismo ideológico dominante.
Tema que, por politicamente correcto, é capaz de não ter outros críticos ou opositores para além do IRRITADO. Paciência.
24.6.14
António Borges de Carvalho