TUDO COMO DANTES
De parabéns estamos todos, especialmente as mulheres grávidas. Foi com a maior alegria que ouvimos e vimos a senhora, dita ministra da saúde, anunciar que o problema das urgências de obstetrícia e ginecologia está resolvido. Como? É simples. Após horas e horas de labuta, de reuniões de alto nível, de profundo pensamento, a senhora ministra diz que vai criar uma comissão (grupo de trabalho, task force, ou outra coisa qualquer), a fim de resolver o problema. No seguimento de tão corajosa decisão, a senhora ministra vai, afanosamente, ocupar o seu tempo a nomear os membros da tal comissão. Daqui a umas semanas, no seguimento de trinta e duas reuniões, a comissão tomará posse. Depois, discutirá o valor das senhas de presença a atribuir aos comissários da comissão, valor a propor ao ministro das finanças, a fim de libertar os necessários fundos. O ministro das finanças, seguindo decisão a tomar em conselho de ministros, se tudo correr bem aprovará a verba. Uma vez a decisão publicada no jornal oficial, a comissão reunirá pela primeira vez. Tudo como dantes.
O que se pode, com inteira justiça e para já, pensar, é que as parturientes, se precisarem de assistência, deverão recorrer à comissão mediante preenchimento de formulário adequado e digitalizado. E o problema está resolvido.
O que se sabe é que as chamadas autoridades confessam que o problema foi detectado há meses, nada tendo sido feito, certamente por falta de tempo ou por haver outras tarefas mais urgentes. E dizem-nos, repondo a verdade, que o SNS funciona maravilhosamente, como o prova o gigantesco triunfo das vacinas. O povo ignaro e mal informado julgava que quem tratou desse assunto foi a tropa. Engana-se, foi a senhora ministra, com o SNS à rédia curta.
Mas o mais notável do dia foi o facto de a senhora ministra ter “admitido” recorrer aos privados. Tratar-se-á de uma decisão destinada a desmentir as verrinosas opiniões que por aí circulam a acusar o governo de ser ultra estatista, sacrificando o povo para provar a excelência do socialismo? Aplauda-se. Depois de ter acabado com a gestão privada dos hospitais públicos, dando largas às suas convicções ideológicas, a senhora ministra “admite” recorrer aos privados para pôr as portuguesas a dar à luz em paz e sossego. “Admite”, não recorre. Esperar-se-ia que a senhora ministra já conhecesse as possibilidades disponíveis dos privados, se é que as há, para resolver a questão. Mas isso seria confessar a estupidez institucionalizada a bem do todo poderoso Estado. Por isso que só seja de “admitir”, e em caso de desespero. Afinal, não há nada para aplaudir.
Tudo como dantes.
16.6.22