UM HORRÍVEL MISTÉRIO
Rezam as crónicas, unanimemente, que Rio é um homem sério, exigente consigo e com os outros, um fulano que traça linhas rectas, não tergiversa, não cede a pressões, etc., um mar de elogios que não tenho motivos para pôr em causa.
Não tenho, ou não tinha? Não tinha. Como pode um homem com tais qualidades fazer de uma criatura do calibre da dona Elina responsável número dois da sua direcção política? Uma fulana ligada a um tal Marinho (que dispensa apresentações), que deixou a Ordem dos Advogados mergulhada em má gestão, em favorecimento, em falta de controle, etc., a braços com investigações do Ministério Público e do Tribunal de Contas, populista desbocada, demagoga irresponsável, sem imagem pública outra que não seja o histerismo das queixas (crime!) contra o PSD e o seu governo (queixas, como é óbvio, liminarmente arquivadas por quem de direito), uma desgraça de pessoa e, além do mais, confessa protectora do Pinto de Sousa.
Ou as qualidades a Rio atribuídas são um mito, ou será que o homem, desta vez, deixou que o enganassem? Não sei.
Infelizmente, não foi só esta escolha que põe em causa a sua justa fama. Rio não terá culpa das “técnicas eleitorais” do seu amigo Milheiro, nem dos seus contratos com os amigos em casos do género “relva sintética”. Mas não pode deixar de saber que tais modos de fabricação de eleitores ou que tais contratos geram dúvidas que, até ver, não tiveram, nem desmentido, nem contestação que se veja. Porquê pô-lo onde o pôs?
Onde vão parar a seriedade, a exigência, as linhas rectas, a firmeza contra as pressões? O menos que pode dizer-se é que o capital de que Rio dispunha é chamuscado, se não deitado ao lixo logo à primeira penada.
É pena. Rio fez em discurso notável, mostrou séria intenção reformista, revelou convicções firmes de uma social-democracia moderada, sem laivos de socialismo, pôs a nu, com cristalina verdade, os malefícios do poder vigente e os miseráveis caminhos por onde a geringonça se arrasta e nos arrasta, teve a coragem de se oferecer para um diálogo que sabe impossível enquanto houver Costa, enquanto o PS for a pervesa comédia em que se transformou.
Sou eleitor do PSD sem jamais ter sido social-democrata. Mas admiro a qualidade do discurso de Rui Rio, mesmo onde não concordo com ele. Precisamos de homens que saibam pôr pontos nos is e, sobretudo, que sejam capazes, como admito que Rio seja, de apontar caminhos - e de os levar avante - que nos dêem o esperança no futuro que o PS trata de arruinar todos os dias.
Pena é que fique, pondo em causa à partida a credibilidade das suas ideias, este horrível mistério. Se, antes disto, me dissessem que as suas escolhas seriam as que vieram a ser, diria que o estavam a insultar.
Porquê, ó gentes, porquê?
19.2.18