VÃO VER!
Como é bom nada fazer e ter tudo!
Nada ter, ou pouco, numa continha da CGD, mais uns empréstimos a pagar, mas sem problema, que há amigos! Que bom!
Ter um Mercedes dos bons, um motorista privativo, uma femme de ménage, uma secretária para os convites para almoçar no Aviz e para outras coisas indispensáveis a um homem da minha posição, um casarão em Paris, o Sena bruxulear aos meus pés, jantar na Lipp, na Coupole, no Café de Paris ou, melhor ainda, no Plaza Athenée, no Fouquet, na Tour d’Argent, passar os serões no Man Ray, no Boudha, no Costes, ir a Lisboa, ao Rio de Janeiro, a Miami, a Londres para reuniões com amigos, onde me apetecer, sempre em primeira, um magnífico andar no Marquês, vestir no Armani ou no Bichan (se não é Bichan é outra bichice do género) em Nova York e Los Angeles, ir, no Inverno de cá, até às Caraíbas, as salsas ondas a acariciar-me a fina pele...
... tudo sem fazer a ponta de um chanfalho, sem pagar um tostão, um amigo a tratar de tudo, a mandar as notas que forem precisas para onde for preciso, a pagar os andares, o Mercedes, o motorista, a secretária, os almoços, os jantares, as viagens e mais o que me apetecer, que bom!
Bem vistas as coisas, que mal há nisso? O amigo tem uma data de milhões em nome dele, não lhe faz diferença nenhuma, é tudo amizade e da boa. O Salgado não tem um amigo que lhe deu 14 milhões, por puros sentimentos de solidarieade e compreensão? Alguém tem alguma coisa com isso? Era o que faltava!
Porque é que há-de haver gente tão maldosa, tão invejosa, baixa ao ponto de pôr em causa a minha suave vidinha e a minha impecável pessoa? Não se compreende, é o fim da democracia, da reserva da vida privada, do respeito cívico, pura maldade, malquerença, cinismo, canalhice, como muito bem disse o meu camarada Mário Só Ares.
Vão ver que os macacões que me perseguem acabarão por não provar coisíssima nenhuma, a massa é toda do meu amigo, ele é que a ganhou, ninguém tem nada a ver com o destino que dá ao que é dele, não é evidente? Um benemérito da Nação, um homem que pegou nas reservas financeiras que tinha a render a bom recato e as repatriou, declarando ao fisco e pagando o que o fisco lhe exigiu! Quem poderá tocar-lhe na fímbria das vestes, ou na das minhas, sem se transformar, ou ser, um canalha? Ninguém.
Vão ver que, um dia, mais cedo ou mais tarde, me será reconhecida a minha real estatura de grande homem, daqueles que a Nação precisa, e serão arrastados na lama os que me perseguem. Aliás como sempre, não é? Os conspiradores bem tentaram, mas eu saí-me de todas, e por cima. Porque não me sairei desta?
Esperem e verão.
Évora, 22 de Dezembro de 2014
PSousa (Engº)