VINTE E CINCO DE ABRIL
Entre abraços e beijos, o trambolho Soares, comovido, disse ao Otelo: “Você é o nosso herói!”.
Pois.
Otelo, o “general” do COPCON, que mandava prender pessoas sem sequer saber quem eram, que ameaçou assassinar gentes indiscriminadas no Campo Pequeno, cuja fúria assassina havia de se materializar na fundação e direcção da mais mortífera organização terrorista que a III República conheceu, dezassete pessoas cobardemente assassinadas, vinte atentados à bomba, assaltos a bancos, etc. é… o “nosso herói”. Quem assim o considera foi presidente da república, entre outras coisas… o que o move agora?
Se um canalha de dimensão de Otelo é um herói da democracia, então a democracia não se respeita a si própria. No caso vertente é o trambolho que, por raiva e frustração partidária, alardeando os mais reles sentimentos e a mais acabada das irresponsabilidades, trata um bandido, um terrorista, um assassino, por “herói”.
Para quem acha que o 25 de Abril valeu a pena não pode haver maior ofensa a tal data.
Adiante, que há mais porcaria. O autoproclamado dono, ou principal accionista, do 25 de Abril, outro general de aviário, depois promovido a coronel sabe-se lá porquê, um tipo que deixou de trabalhar, mas não de receber, há para aí trinta anos, passeou a sua porcina figura pelo largo do Carmo, onde fez um discurso que o camarada Jerónimo gostosamente subscreveria, e se declarou ali “com o povo”. Haveria que perguntar qual povo. E responder: qual povo qual carapuça! O que ali estava eram as hostes do Carlos, do Louçã, do Sousa e, com certeza, alguns incautos comproblemas, a servir de raminho de salsa: no fundo, os mesmos que haviam de ir à Avenida dar berros contra o governo, gritar, estilo Manel Alegre, contra as “ameaças à democracia”, como se ameaças à democracia não fossem a miserável apropriação e partidarização de uma data que devia ser de congratulação geral, o povo unido na comemoração da democracia, em vez de palco para acusações e gritaria.
Mas há mais. No Parlamento, três partidos e um penduricalho do PC dedicaram o tempo de antena a defender o indefensável – as omeletes sem ovos – em vez de louvar a Liberdade, ou na recorrente contumácia de confundir a Liberdade com a liberdade de ser socialista. Nem o Presidente escapou: as hordas que fazem profissão de fé num republicanismo à moda de Robespierre abstiveram-se de o aplaudir e ficaram sentados à sua entrada. A democracia, a própria República, para eles, ou é sinónimo do seu poder ou não é nem democracia nem república!
Não se sabe se esta pobre terra, alguma vez na vida, terá uma noção clara do que é importante e nos pode unir como povo, coisa que não é, nem o socialismo nem o imobilismo constitucional que tanto mal nos têm feito.
Mas é de esperar que, na hora da verdade, o povo propriamente dito, não a maralha do Soares e Cª, manifeste, e certamente manifestará, que o povo é outra coisa que não as multidões arregimentadas por gente que, dizendo defender a Liberdade e a Democracia, outra coisa não fazem que não seja senão pô-las pelas ruas da amargura.
25.4.14
António Borges de Carvalho