VIRACASAQUISMO
O pesado nortenho Carlos Abreu Amorim , homem de vasta envergadura (como nos pardais e nos aviões, envergadura é a distância que vai da ponta de uma asa à ponta da outra), veio surpreender as gentes ao afirmar que “deixou de ser liberal”, porque acredita num “Estado forte”. Há quem diga que este grande opinante é prodessor não sei de quê, jurista de uma especialidade qualquer e que, tendo entrado na política como independente pela mão de Passos Coelho, depressa se filiou no partido, sendo este social-democrata.
O fulano consegue ser, ao que parece, de tudo um pouco. Dirá quem isto ler que o PSD não é social-democrata. Terá razão, porque o PSD, nas actuais circunstâncias, não é coisa nenhuma, isto é, cabe-lhe gerir a embrulhada nacional, o que exige pragmatismo e atenção às opiniões dos fulanos de Bruxelas e aos humores dos credores. O mesmo acontecerá ao PS, se tivermos a monumental desgraça de o ver voltar ao poder com o seu abominável cortejo de irresponsáveis.
No caso do nosso herói, como é evidente, o súbito abandono das convicções liberais, sem indicação clara das que as substituiram lá nos neurónios, não se deve, por isso a pressões partidárias. Nem se deverá a alguma iluminação, tipo São Paulo à beira do abismo, que o fizesse abjurar de anos e anos de postura liberal.
Segundo o douto parecer do IRRITADO a razão só pode ser uma: o rapaz não faz ideia do que seja liberalismo. Não terá lido, não se terá informado, não pensou no assunto, não olhou para a história: a coisa não passava de rótulo a que se agarrava para se sentir diferente, para ter um lugar aparte em colóquios e debates. Ou então o tipo é burro, o que não parece corresponder à verdade.
Quer um Estado forte? Confunde, com certeza, Estado forte com Estado proprietário, empresário, juiz em causa própria. Não vê, sequer, que os políticos que usam ser tratados por liberais ou ultra liberais, foram líderes fortíssimos de Estados tão fortes quanto eles. Ou seja, excluiram o Estado do que lhe não competia, e deram liberdade às suas sociedades. O tal Amorim não terá, sequer, na cabeça, as grandes máximas liberais que nos ensinam ser o liberalismo o capitalismo nos limites da lei democrática. Não é capaz de pensar que, onde o capitalismo falha, exagera, abusa, é porque o Estado ou não soube cumprir as suas funções ou se meteu onde não era chamado. O liberalismo é incompatível com ditaduras, como é incompatível com o socialismo. Há liberalismo onde há liberdade social, política e económica, lei, mercado. Em suma, onde cada um é responsável pelo que faz, respeitando os demais. Será legítimo, ou possível, abjurar do liberalismo, quando se compreende estes tão simples princípios?
Justo é dizer que, por cá, nunca houve liberalismo, nem quando, o chamado liberalismo político se impôs no sec. XIX, depois da guerra, nem no sec. XX depois da república, ainda menos depois do mergulho ultrasocialista que o 25 criou. O que pode ser motivo de tristeza ou alegria, segundo a postura de cada um, mas não devia servir para que liberias que como tal se afirmam deixem de ser o que são. A não ser que nunca o tivessem sido ou que nunca tivessem percebido o que andavam a defender. Amorins destes não fazem cá falta nenhuma.
23.12.14
António Borges de Carvalho